:: Samba triste
Das músicas mais lindas do Baden. E custei um ano, quase dois, para voltar a ouvi-lo. Hoje não me arranca aquelas lágrimas que inundam, mas passado é algo que sempre me dói, feliz ou triste: "saudade, resto de amor, de amor que não deu certo".
quarta-feira, novembro 30
:: Encontros
Faz um tempo já que acabei de ler "Noites Brancas", do Dostoiévski. E tenho aquele costumeiro vazio, ao acabar um livro de que gosto muito. Quanto mais leio esse russo, mais fico admirada. Esse foi um dos meus prediletos. E grifei, gridei, grifei. Algo que me soou um pouco com o antes e o depois do por-do-sol, do amanhecer, sabe-se lá os nomes exatos dessa dupla de filmes que me diz tanto sobre encontros. Essa coisa preciosa do encontro entre duas pessoas.
"Escute, por que parece sempre que até o melhor dos homens esconde algo do outro e se cala diante dele? Por que não dizer logo, diretamente, o que está no coração, se sabemos que não serão palavras ao vento? Mas todos aparentam ser mais duros do que realmente são, é como se todos temessem ofender seus sentimentos ao expressá-los muito depressa."
Faz um tempo já que acabei de ler "Noites Brancas", do Dostoiévski. E tenho aquele costumeiro vazio, ao acabar um livro de que gosto muito. Quanto mais leio esse russo, mais fico admirada. Esse foi um dos meus prediletos. E grifei, gridei, grifei. Algo que me soou um pouco com o antes e o depois do por-do-sol, do amanhecer, sabe-se lá os nomes exatos dessa dupla de filmes que me diz tanto sobre encontros. Essa coisa preciosa do encontro entre duas pessoas.
"Escute, por que parece sempre que até o melhor dos homens esconde algo do outro e se cala diante dele? Por que não dizer logo, diretamente, o que está no coração, se sabemos que não serão palavras ao vento? Mas todos aparentam ser mais duros do que realmente são, é como se todos temessem ofender seus sentimentos ao expressá-los muito depressa."
sábado, novembro 26
terça-feira, novembro 22
:: Registros inúteis
Eu amo, amo essa menina. E tenho vontade de registrar todos os diálogos que tenho com ela pra reler e rir mais e mais. Hoje:
- eu comecei a tomar herbalife hj. que cafona, nem espalha!
- rararara, mas você está linda. o auge da beleza.
- eu tô pq eu tô amando apaixonada né. niqui passa a paixão fica os bagulho. aí eu tô 10kg acima do meu peso (segundo meu amigo vendedor da herbalife)
Eu amo, amo essa menina. E tenho vontade de registrar todos os diálogos que tenho com ela pra reler e rir mais e mais. Hoje:
- eu comecei a tomar herbalife hj. que cafona, nem espalha!
- rararara, mas você está linda. o auge da beleza.
- eu tô pq eu tô amando apaixonada né. niqui passa a paixão fica os bagulho. aí eu tô 10kg acima do meu peso (segundo meu amigo vendedor da herbalife)
domingo, novembro 20
:: Diálogos inúteis
- Plantão?
- Isso!
- Eu também. E estou com fome, pulei o café da manhã.
- Idem. Tive que escolher entre banho e café e o banho ganhou só porque estou lendo um livro que diz que o banho precisa ganhar.
- ARARARARA! Que livro?
- A Parisiense - O guia de estilo de Ines de La Fressange. Foi a primeira modelo exclusiva da Chanel.
- Conta a parte do banho.
- É isso, ela diz que tem que tomar banho todo dia e lavar o cabelo todo dia, sem negociação. Deve ser uma dica importante na França. Até no Brasil tem sido.
- Plantão?
- Isso!
- Eu também. E estou com fome, pulei o café da manhã.
- Idem. Tive que escolher entre banho e café e o banho ganhou só porque estou lendo um livro que diz que o banho precisa ganhar.
- ARARARARA! Que livro?
- A Parisiense - O guia de estilo de Ines de La Fressange. Foi a primeira modelo exclusiva da Chanel.
- Conta a parte do banho.
- É isso, ela diz que tem que tomar banho todo dia e lavar o cabelo todo dia, sem negociação. Deve ser uma dica importante na França. Até no Brasil tem sido.
:: A chave amarela
É um almoço para poucas pessoas. Ele vai deixar São Paulo e um pouco de cada um de nós. E tem aquele Drummond de que amo desde sempre, e logo me veio à cabeça, "O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas". Não hei de me afastar dele. E, sabe, mesmo não estando muito inspirada hoje para lhe escrever longamente, tem uma história que sou capaz de recuperar. A história que nós mesmos batizamos de "chave amarela". Há uns tantos anos, quando assisti "My Blueberry Nights", passei a entender o que diabos eu tinha com as chaves. Essa adoração, como se eu fosse abrir alguma coisa secreta, secreta e encontrar um mundo mais seguro e feliz, de repente. Do filme, pouca coisa me despertou. Tem Jude Law, tem a trilha sonora, linda, linda (exceto a Joss Stone, que me cansa deveras) e tem o lance das chaves. Bem no comecinho, no bar (ou no restaurante, não me lembro mais), ele mostra aquele vidro cheio delas, as esquecidas, as deixadas. Me fogem os detalhes. E foi ali, naquele momento, que me fez sentido o chaveiro da vaca Geralda (um chaveiro que carreguei pra cá e pra lá por anos, anos) carregado de chaves que não fazem mais sentido. Eu era a única neta com as chaves da casa de vovô e vovó. E vovô me fez um jogo colorido --e eu nunca havia visto chaves coloridas-- para que ficasse claro, só num decorar de cores, qual era a do primeiro portão, a da porta dos fundos e a da porta principal. E eu andava com aquele molho de chaves no maior orgulho de ser a única, a única neta, de 13, a ter as chaves da casa de vovô e vovó. Mas depois vovó morreu. E passado mais um tempo, um ano, dois, três, vovô morreu, sereno. A casa ficou à venda, depois de muito demorar, pois foi preciso nos desfazer de montes de coisas --vovô era colecionador obstinado, eram livros, discos, obras de arte, quadros. Uma beleza de casa. E fizemos aquela coisa triste, triste de abrir a casa a desconhecidos, depois de pinçarmos, em família, tudo o que iríamos manter entre os Santos Vieira. Mesmo passado tudo isso de tristeza e vazio e certa solidão --eram únicos, únicos, vovó fazia barquinhos de pão francês para nadar no café com leite (e foi, até hoje, a única pessoa capaz de fazer meu café com leite à perfeição), vovô passava horas a nos falar sobre livros e discos--, mantive as chaves daquelas mesmas portas, que sabe-se lá onde estão agora, no meu chaveiro da vaca Geralda. E aí que esse moço, sobre o qual falei ali no início, que vai deixar São Paulo e um pouco de todos nós, um dia me fez a cópia da chave da casa dele, amarela, pois ia viajar e me deixou de babá das gatas. Ele sabe, são gatas amáveis (e eu amo gatos). Ele sabe. E então, quando voltou de viagem, combinamos de manter a chave comigo. A chave daquela porta, daquele pequeno e aconchegante e adorável apartamento de janelas largas e badulaques nas paredes. E assim foi. Meu chaveiro, do gato do British Museum, pois aposentei a vaca Geralda, já caduca, passou a ter a chave amarela que dava passagem para aquele cantinho aprazível. Passou mais um tempo. Um longo tempo, aliás. E, certo dia, meu telefone tocou. Era ele, numa sexta à noite, angustiado, preso para fora de casa. Havia perdido sua chave. Eu estava na casinha a esperar uma visita muito especial. Já tinha tratado de espalhar vasinhos de flor aqui e ali, tocava um disco da Nina de que amo, e quem apareceu foi ele, esbaforido. Ainda não conhecia a casinha e, de certa forma, fiquei meio assim de recebê-lo tão depressa, por conta de uma emergência. Mas entreguei a chave a ele, apresentei o Moacir, e ele se foi, pronto, prontinho para abrir a porta de sua casa. Demorou uma semana e pouco, acho, mas me devolveu a chave amarela. Agora está de partida. Fará esse pequeno almoço em sua casa, num convite que pedia discrição, "porque o apartamento é pequeno, as cadeiras são poucas e o fogão, de quatro bocas, é da marca Daco". Combinamos que a chave permanece no meu chaveiro do gato azul, e a gente pode brincar de abrir nossos segredos, mesmo com essa distância física que vai se colocar entre nós.
É um almoço para poucas pessoas. Ele vai deixar São Paulo e um pouco de cada um de nós. E tem aquele Drummond de que amo desde sempre, e logo me veio à cabeça, "O presente é tão grande, não nos afastemos. Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas". Não hei de me afastar dele. E, sabe, mesmo não estando muito inspirada hoje para lhe escrever longamente, tem uma história que sou capaz de recuperar. A história que nós mesmos batizamos de "chave amarela". Há uns tantos anos, quando assisti "My Blueberry Nights", passei a entender o que diabos eu tinha com as chaves. Essa adoração, como se eu fosse abrir alguma coisa secreta, secreta e encontrar um mundo mais seguro e feliz, de repente. Do filme, pouca coisa me despertou. Tem Jude Law, tem a trilha sonora, linda, linda (exceto a Joss Stone, que me cansa deveras) e tem o lance das chaves. Bem no comecinho, no bar (ou no restaurante, não me lembro mais), ele mostra aquele vidro cheio delas, as esquecidas, as deixadas. Me fogem os detalhes. E foi ali, naquele momento, que me fez sentido o chaveiro da vaca Geralda (um chaveiro que carreguei pra cá e pra lá por anos, anos) carregado de chaves que não fazem mais sentido. Eu era a única neta com as chaves da casa de vovô e vovó. E vovô me fez um jogo colorido --e eu nunca havia visto chaves coloridas-- para que ficasse claro, só num decorar de cores, qual era a do primeiro portão, a da porta dos fundos e a da porta principal. E eu andava com aquele molho de chaves no maior orgulho de ser a única, a única neta, de 13, a ter as chaves da casa de vovô e vovó. Mas depois vovó morreu. E passado mais um tempo, um ano, dois, três, vovô morreu, sereno. A casa ficou à venda, depois de muito demorar, pois foi preciso nos desfazer de montes de coisas --vovô era colecionador obstinado, eram livros, discos, obras de arte, quadros. Uma beleza de casa. E fizemos aquela coisa triste, triste de abrir a casa a desconhecidos, depois de pinçarmos, em família, tudo o que iríamos manter entre os Santos Vieira. Mesmo passado tudo isso de tristeza e vazio e certa solidão --eram únicos, únicos, vovó fazia barquinhos de pão francês para nadar no café com leite (e foi, até hoje, a única pessoa capaz de fazer meu café com leite à perfeição), vovô passava horas a nos falar sobre livros e discos--, mantive as chaves daquelas mesmas portas, que sabe-se lá onde estão agora, no meu chaveiro da vaca Geralda. E aí que esse moço, sobre o qual falei ali no início, que vai deixar São Paulo e um pouco de todos nós, um dia me fez a cópia da chave da casa dele, amarela, pois ia viajar e me deixou de babá das gatas. Ele sabe, são gatas amáveis (e eu amo gatos). Ele sabe. E então, quando voltou de viagem, combinamos de manter a chave comigo. A chave daquela porta, daquele pequeno e aconchegante e adorável apartamento de janelas largas e badulaques nas paredes. E assim foi. Meu chaveiro, do gato do British Museum, pois aposentei a vaca Geralda, já caduca, passou a ter a chave amarela que dava passagem para aquele cantinho aprazível. Passou mais um tempo. Um longo tempo, aliás. E, certo dia, meu telefone tocou. Era ele, numa sexta à noite, angustiado, preso para fora de casa. Havia perdido sua chave. Eu estava na casinha a esperar uma visita muito especial. Já tinha tratado de espalhar vasinhos de flor aqui e ali, tocava um disco da Nina de que amo, e quem apareceu foi ele, esbaforido. Ainda não conhecia a casinha e, de certa forma, fiquei meio assim de recebê-lo tão depressa, por conta de uma emergência. Mas entreguei a chave a ele, apresentei o Moacir, e ele se foi, pronto, prontinho para abrir a porta de sua casa. Demorou uma semana e pouco, acho, mas me devolveu a chave amarela. Agora está de partida. Fará esse pequeno almoço em sua casa, num convite que pedia discrição, "porque o apartamento é pequeno, as cadeiras são poucas e o fogão, de quatro bocas, é da marca Daco". Combinamos que a chave permanece no meu chaveiro do gato azul, e a gente pode brincar de abrir nossos segredos, mesmo com essa distância física que vai se colocar entre nós.
terça-feira, novembro 15
:: Caderno de anotações
"Não é verdade que os apaixonados se enganam. Depois da paixão é que se enganariam. Mas depois da paixão, com perdão do truísmo, não há a paixão. Tudo isso é tão lógico como um teorema bem demonstrado." De "La logique de la paisson", Mme. Dachamps, p. 38, Gallimard, Paris, 1968.
"Não é verdade que os apaixonados se enganam. Depois da paixão é que se enganariam. Mas depois da paixão, com perdão do truísmo, não há a paixão. Tudo isso é tão lógico como um teorema bem demonstrado." De "La logique de la paisson", Mme. Dachamps, p. 38, Gallimard, Paris, 1968.
terça-feira, novembro 8
:: Os clássicos
Tenho pensado muito no vovô. Mais do que o normal. Não sei exatamente o que é. Uma vontade enorme, imensa, tremenda, talvez, de querer compartilhar da minha vida com ele. Aquela escuta atenta e orgulhosa, mas crítica. Aquela escuta que sempre o alimentou de maneira poética, até. E o interesse infindável pela vida. Pelas coisas da vida. E a admiração pelas artes, as obras que tanto amava catalogar. Os livros, os discos. De uma religiosidade e rigidez tamanha para organizar tudo aquilo. E eu, que não me desprendo dessa imagem nunca, nunca, esparramada naquele tapete peludo do escritório (lendo Fernando Pessoa naqueles livros de capa dura, de antigamente), que ficava no subsolo, bem em frente a um lindo jardim, de que cuidava como ninguém. Ali alimentava os pássaros até que ficassem saciados. E voltavam sempre. Cuidava daquelas flores todas e gostava muito, muito de levar os netos praquele cenário e fotografá-los. Depois que ficou mais velhinho fazia muito disso. Fotografava todos os encontros da família e depois mandava cópias para todos, num envelope com o nome de cada um escrito em caneta preta. Ele estava fazendo isso: compartilhando o amor. E sou grata por isso. Muito grata. Sou grata por ele ter me ensinado o amor pelos livros de literatura e de arte, por ter me colocado para ouvir os eruditos à exaustão, por ter me levado a todos os espetáculos de dança do Grupo Corpo e suportado meus ataques de riso quando criança. Hoje, nesta manhã em que perdi o sono antes mesmo de amanhecer, preparei um leite com café e vim ouvir Villa-Lobos. E fiquei aqui pensando, sabe, por que diabos eu não fui a neta a herdar os discos dele de Villa-Lobos. E me deu uma vontade enorme de sair, pular o dia de trabalho, e comprar sua obra completa e ouvir, ouvir. E ler e lembrar e tentar decorar o mapa do mundo para que ele tivesse orgulho de mim. Nunca, nunca se conformou de eu não saber a localização das coisas no mapa. E até hoje não sei - ainda que eu vá aprender, sim, por ele. Dia ou outro, vou aprender. Por enquanto, já aprendi a sequência dos oceanos, por exemplo. Pois, no mapa, eles foram a palavra "pai" - Pacífico, Atlântico, Índico. E então me deu uma vontade de contar sobre minhas andanças pelos sebos e minhas leituras dos livros de antigamente. Sobre os shows que tenho ido e sobre os jardins de apartamento que tenho feito aos fins de semana para me alegrar o decorrer dos dias. Contar que lembro do amor que ele guardou pela vovó até o fim - e que isso foi me ensinar, mais, sobre o amor. Sobre os buquês de rosas vermelhas com que ele fazia questão de presenteá-la - as levava, as flores, até a cama, para que ela pelo menos as olhasse, mesmo que não entendesse, com clareza, o que eram aquelas rosas vermelhas e o que representavam. Uma vontade de que ele lesse minhas reportagens e me ouvisse no rádio. Uma saudade, acho, de algo que era tão verdadeiro. E tão raro.
Tenho pensado muito no vovô. Mais do que o normal. Não sei exatamente o que é. Uma vontade enorme, imensa, tremenda, talvez, de querer compartilhar da minha vida com ele. Aquela escuta atenta e orgulhosa, mas crítica. Aquela escuta que sempre o alimentou de maneira poética, até. E o interesse infindável pela vida. Pelas coisas da vida. E a admiração pelas artes, as obras que tanto amava catalogar. Os livros, os discos. De uma religiosidade e rigidez tamanha para organizar tudo aquilo. E eu, que não me desprendo dessa imagem nunca, nunca, esparramada naquele tapete peludo do escritório (lendo Fernando Pessoa naqueles livros de capa dura, de antigamente), que ficava no subsolo, bem em frente a um lindo jardim, de que cuidava como ninguém. Ali alimentava os pássaros até que ficassem saciados. E voltavam sempre. Cuidava daquelas flores todas e gostava muito, muito de levar os netos praquele cenário e fotografá-los. Depois que ficou mais velhinho fazia muito disso. Fotografava todos os encontros da família e depois mandava cópias para todos, num envelope com o nome de cada um escrito em caneta preta. Ele estava fazendo isso: compartilhando o amor. E sou grata por isso. Muito grata. Sou grata por ele ter me ensinado o amor pelos livros de literatura e de arte, por ter me colocado para ouvir os eruditos à exaustão, por ter me levado a todos os espetáculos de dança do Grupo Corpo e suportado meus ataques de riso quando criança. Hoje, nesta manhã em que perdi o sono antes mesmo de amanhecer, preparei um leite com café e vim ouvir Villa-Lobos. E fiquei aqui pensando, sabe, por que diabos eu não fui a neta a herdar os discos dele de Villa-Lobos. E me deu uma vontade enorme de sair, pular o dia de trabalho, e comprar sua obra completa e ouvir, ouvir. E ler e lembrar e tentar decorar o mapa do mundo para que ele tivesse orgulho de mim. Nunca, nunca se conformou de eu não saber a localização das coisas no mapa. E até hoje não sei - ainda que eu vá aprender, sim, por ele. Dia ou outro, vou aprender. Por enquanto, já aprendi a sequência dos oceanos, por exemplo. Pois, no mapa, eles foram a palavra "pai" - Pacífico, Atlântico, Índico. E então me deu uma vontade de contar sobre minhas andanças pelos sebos e minhas leituras dos livros de antigamente. Sobre os shows que tenho ido e sobre os jardins de apartamento que tenho feito aos fins de semana para me alegrar o decorrer dos dias. Contar que lembro do amor que ele guardou pela vovó até o fim - e que isso foi me ensinar, mais, sobre o amor. Sobre os buquês de rosas vermelhas com que ele fazia questão de presenteá-la - as levava, as flores, até a cama, para que ela pelo menos as olhasse, mesmo que não entendesse, com clareza, o que eram aquelas rosas vermelhas e o que representavam. Uma vontade de que ele lesse minhas reportagens e me ouvisse no rádio. Uma saudade, acho, de algo que era tão verdadeiro. E tão raro.
domingo, novembro 6
:: Amor de gato
Tenho loucura pelo Moacir, o tigrinho. Ele me foi um presente do meu tio num momento difícil da vida. É para você aprender o amor de gato, ele me disse. E Moacir sempre foi assim: um exemplo de amor de gato. Diferente de todos os outros que já tive: grudados, exageradamente dóceis, um amor incontrolável. Moacir, o tigrinho, não. Moacir tem uma coisa selvagem. Não é arredio, mas não gosta de colo. Mas gosta de ficar colado. E eu o observo com toda a atenção. Nessa missão-pra-sempre de aprender sobre o amor dos gatos. E ele me dá pequenas alegrias com suas manias. O lugar que mais gosta na casinha, por exemplo, é o box de vidrotil branco, molhado, depois que saio do banho. Ele se esparrama ali religiosamente, faça chuva, faça sol. Das brincadeiras de que mais ama está a loucura pelas pedras de gelo do meu copo d'água matinal. Ele derruba um a cada dois dias no sofá, e não consigo ralhar. Pois ele coloca a patinha dentro do copo para pegar as pedrinhas de gelo, enquanto estou compenetrada escrevendo, na maior parte das vezes, ou lendo, e vira o copo numa alegria sem fim, até que espalha as pedrinhas de gelo ali sobre o tapete vermelho e corre de lá pra cá com elas, de cá pra lá. E assim vai. Tem outros coisas. Ele sobe na minha bancada cheia, lotada, abarrotada de cacarecos e não derruba (quase) nada. Sempre. Ele derruba propositalmente apenas um porquinho miúdo de madeira. Passa no maior equilibrismo entre a bicileta, os vasinhos de flor, a cadeirinha em miniatura e isso e aquilo. E não derruba nada. Nem sem querer. Apenas o porquinho de madeira, que empurra com a patinha, no maior cuidado, até que caia no chão. E então pula lá de cima com uma alegria que posso reparar à distância e corre pela minicasa jogando o tal porquiho de cá pra lá. Para comer, ele também tem alguns rituais. Gosta da água temperada, como já contei aqui vezes e vezes, e de ração crocante. Por isso insisto em colocar de poquinho em pouquinho. E ele fica assim pertinho do potinho da ração, pega os grãos com a patinha, um por um, joga para fora do potinho e aí come. E eu acho amável, amável. E ele ama ouvir música comigo. Gosta de tango e de Caetano Veloso. Gosta de Django e Nina Simone. E fica na maior alegria quando coloco Billie Holiday pra gente, o mesmo nome da gata da vizinha da frente. Aliás, ele tem estado muito empenhado em construir uma relação com o cãozinho da vizinha do lado. Noa adentra a casinha numa agitação de criança e eles brincam, brincam. Uma lindeza. E eu, sabe, eu observo. Observo até que eu aprenda essa coisa do amor dos gatos...
Tenho loucura pelo Moacir, o tigrinho. Ele me foi um presente do meu tio num momento difícil da vida. É para você aprender o amor de gato, ele me disse. E Moacir sempre foi assim: um exemplo de amor de gato. Diferente de todos os outros que já tive: grudados, exageradamente dóceis, um amor incontrolável. Moacir, o tigrinho, não. Moacir tem uma coisa selvagem. Não é arredio, mas não gosta de colo. Mas gosta de ficar colado. E eu o observo com toda a atenção. Nessa missão-pra-sempre de aprender sobre o amor dos gatos. E ele me dá pequenas alegrias com suas manias. O lugar que mais gosta na casinha, por exemplo, é o box de vidrotil branco, molhado, depois que saio do banho. Ele se esparrama ali religiosamente, faça chuva, faça sol. Das brincadeiras de que mais ama está a loucura pelas pedras de gelo do meu copo d'água matinal. Ele derruba um a cada dois dias no sofá, e não consigo ralhar. Pois ele coloca a patinha dentro do copo para pegar as pedrinhas de gelo, enquanto estou compenetrada escrevendo, na maior parte das vezes, ou lendo, e vira o copo numa alegria sem fim, até que espalha as pedrinhas de gelo ali sobre o tapete vermelho e corre de lá pra cá com elas, de cá pra lá. E assim vai. Tem outros coisas. Ele sobe na minha bancada cheia, lotada, abarrotada de cacarecos e não derruba (quase) nada. Sempre. Ele derruba propositalmente apenas um porquinho miúdo de madeira. Passa no maior equilibrismo entre a bicileta, os vasinhos de flor, a cadeirinha em miniatura e isso e aquilo. E não derruba nada. Nem sem querer. Apenas o porquinho de madeira, que empurra com a patinha, no maior cuidado, até que caia no chão. E então pula lá de cima com uma alegria que posso reparar à distância e corre pela minicasa jogando o tal porquiho de cá pra lá. Para comer, ele também tem alguns rituais. Gosta da água temperada, como já contei aqui vezes e vezes, e de ração crocante. Por isso insisto em colocar de poquinho em pouquinho. E ele fica assim pertinho do potinho da ração, pega os grãos com a patinha, um por um, joga para fora do potinho e aí come. E eu acho amável, amável. E ele ama ouvir música comigo. Gosta de tango e de Caetano Veloso. Gosta de Django e Nina Simone. E fica na maior alegria quando coloco Billie Holiday pra gente, o mesmo nome da gata da vizinha da frente. Aliás, ele tem estado muito empenhado em construir uma relação com o cãozinho da vizinha do lado. Noa adentra a casinha numa agitação de criança e eles brincam, brincam. Uma lindeza. E eu, sabe, eu observo. Observo até que eu aprenda essa coisa do amor dos gatos...
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