terça-feira, março 9

:: Cidade do interior

Verdade, sou das cidades grandes e cheias de coisas para fazer. Mas vejo sim certo romantismo nas cidadezinhas do interior, na sorveteria do bairro, nos pequenos mercados, nos encontros. Talvez seja um estado de espírito, mas, ultimamente, tenho visto romantismo até nos detalhes do dia a dia. Chega a ser cafona. Eu sei.

Hoje caminhei ali do metrô até o cantinho novo dele. Engraçado, eu, tão medrosa, cheguei a esquecer que estava no meio do centro, andando sobre calçadas sujas e malcheirosas. Logo que você salta do ônibus pisa num plano extenso, como uma praça do interior. Já é hora do jantar e estamos na terça-feira, mas ali está agitado como se fosse sábado. Como se fosse algum horário qualquer depois do jantar. Meninas de saia e batom, meninos de camisa com o primeiro, segundo e terceiro botões abertos.

E então você caminha com um ou outro livro na mão, como se estivesse voltando da escola. Um garoto chega numa rodinha de amigos e dá um oi risonho. A garota está ali na banca, de olho nas revistas de fofoca. Uma banca grande e iluminada, na calçada de paralelepípedo, em frente a uma árvore robusta, que deve dar frutos lá pelas tantas.

A luz na praça não é forte nem fraca, mas em volta das luminárias públicas ficam aqueles bichinhos irritantes, voando freneticamente. E uma música vem do bar dali do outro lado da rua. Na rua ali adiante dá pra reparar o movimento. Tem um bar ao lado do outro, com mesinhas na calçada e pessoas caminhando do outro lado da rua, voltando do trabalho, que lhes tomou o dia (isso tá certo? lhes tomou o dia?).

Você vai caminhando, com os mesmos livros debaixo dos braços, passos mais lentos. E logo ali, ao lado daqueles senhores que ficam o dia jogando damas em mesinhas que eles mesmo improvisam na praça sobre os paralelepípedos, tem uma igreja. Claro, uma igreja. Se não não seria uma cidadezinha do interior. Dá para entender. Uma construção antiga, com vitrais que fazem a gente parar e observar. E o sino toca sempre às seis da tarde. Na época da mudança do horário de verão, virou piada, o sino seguiu tocando às seis, mas não eram mais seis, eram cinco.

Uns passos a frente e tem dois pequenos mercados, produtos genéricos, uma padaria, um boteco que deve atrair a turma do futubol nos dias de jogo e vende fiado em casos especiais, aos vizinhos. Aí você chega em casa. Você chega e repara que, do seu lado da cama, agora tem um daqueles caixotes de madeira e um abajur. Um caixote de madeira meio velho que tem seu charme e dá sequência ao clima interiorano que gosto de sentir quando estou aqui. Ele preparou assim só pra mim. Improvisou um criado-mudo para que eu possa ler antes de dormir. Lembra dos livros debaixo do braço?

Depois esquenta o queijo na frigideira, coloca gelo num copo alto e enche de Coca, bem como eu gosto. Me serve delicadamente enquanto vejo um pedaço da novela da rede. Depois me dá um beijo. E eu digo o quanto gosto dele. Tem sido assim.

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