:: O relato da entrada do jantar
Uns dias antes, eu abri o moleskine e anotei um monte, todas as recomendações. Vá ao Mercadão, na banca Ki Peixe, e fale com o japonês. Chegando lá, o japonês tinha se aposentado. Fiz o tipo da cliente de anos e pedi para falar com quem pudesse me atender com a mesma competência. Tudo certo. Seu Cícero fez às vezes do japa e ficou tudo certo. Exibiu todos os seus atuns, fresquíssimos, gordos, em lindas peças. Dizia, ao funcionário, mostre aquele, vire, vire de novo, pra lá, pra cá. Tá vendo?, ele dizia olhando pra mim. E eu estava _e a boca salivando. Eu preciso de mais ou menos um quilo, quanto está aquele ali, mais fresco e mais gordo? Ótimo. Eu quero aquele. Corte em toras para sashimi? O funcionário, que balbuciava algumas poucas palavras, embalou a vácuo, pediu minha sacola térmica _pois eu vou ao Mercadão com sacola térmica. Antes de guardar, me mostrou os cortes. Aprovei (como não?). Colocou gelo, sem que eu pedisse. Arrumou tudo, passou um pano e eu estava ali, apertando as mãos do Cícero e agradecendo. Eu volto para contar como foi o jantar.
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O peixe ficou no fundo da geladeira, naquele pedaço mais geladinho, para suportar, muito bem, até o dia seguinte. E o dia seguinte começou tenso. Ela tensa, eu tensa. Relógio correndo e a coisa só ficava mais tensa. Caetano Veloso para acalmar _sempre funciona. A coisa foi amolecendo, fomos conversando lado a lado, disputando o melhor espaço na bancada preta da cozinha e certo cuidado para não estragar as unhas, que fizemos juntas um pouco antes de começar a produção. Tudo em ordem, mas ainda com as roupas do dia no corpo, chegam os primeiros convidados. Ela foi primeiro se arrumar. Eu fiz sala. Eu fui depois. A mesa criou certo impacto na chegada. Estava lindamente arrumada, com as louças novas que compramos na Liberdade, os hashis, a panela de shabu-shabu, que ajuda a no efeito.
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Enquanto eu dava explicações sobre o saquê que eu ia servir _pois, claro, eu escolhi um “tobubetsu junmai”, com fermentação natural, sem adição de destilados, e com aproveitamento de 65% ou menos do arroz (que, quanto mais polido, melhor a bebida final)_, ela tirou a embalagem da geladeira. Somos uma dupla organizada na cozinha, é divertido. Ela esquentou uma frigideira nova, antiaderente, até ficar bem quente e começou a selar, rapidamente, o atum. Ao lado, eu estava esperando com uma faca bem afiada. Lentamente cortei as peças em sashimis, tombei um no outro em uma louça branca comprida e retomei a lista dos ingredientes _que já estavam ali, separados.
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Cozinha e sala juntas permite uma interação e movimento que eu sempre aprendi a gostar muito com a família. Não foi diferente. Um passava perto, dava aquela olhadinha de lado, fazia perguntas. Antes de finalizar, circulei a flor-de-sal (vinda diretamente da França) entre os convidados para que todos provassem um pouco. É algo que merece ser provado sozinho. Depois, finalizei a entrada. Primeiro, um fio de azeite trufado. Em seguida, raiz-forte em pó. Um outro temperinho da S&B que mistura pimenta dedo-de-moça e gergelim torrado (fica bem vermelhinho com uns pontos pretos). Flor-de-sal e, para acabar, as lascas de limão-siciliano em duas espessuras diferentes.
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Todos sentam à mesa e é hora de explicar a receita, o dia de ir até o Mercadão-Cícero; a embalagem-a-vácuo-mais-temperos-da-Liberdade; onde-se-come-na-Liberdade-ára-uma-pausa; onde-se-come-no-centrão-idem; a frigideira-bem-quente-mais-lascas-de-limão-siciliano e tal. Porque eu adoro esses pequenos rituais e meu eleitorado idem. E aí comemos.
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Um comentário:
Quero o prato principal. E a sobremesa. O café... Quero o relato detalhado de tudo, tudo, tudo.
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