sábado, abril 25

:: Os platônicos

A gente sempre teve uma coisa meio platônica. Essa coisa das palavras, das músicas, dos livros. Ele me gravava discos chamados "songs for luiza", assim, em caixa baixa, e mandava livros pelo correio, com cartas. Só ele entende a minha fixação por cartas e eu nem mandei um postal de Paris...

Ainda assim, continua essa coisa das palavras, das músicas, dos livros. A gente passa dias, semanas, sem se falar. Eu sei. Ele sabe. Por isso que, de repente, ele pode me mandar as canções da Comadre Fulozinha e dizer: eu gosto porque tem uma coisa lúdica - e ele sabe como vou entender exatamente o que quer dizer.

E então, numa conversa que surge do nada, ele diz que gosta dos meus textos e da minha mania pelos detalhes. E eu peço pra ele me mandar uma música muito triste - muito mesmo. Um dia, quando a gente tinha um amor platônico que nunca vou esquecer, ele me chamava de principessa e escrevia poemas, e combinamos de trocar discos com as canções mais tristes. Era quase uma coisa competitiva de quem ia ser mais capaz de traduzir a tristeza das canções. No fim, ninguém gravou disco nenhum. A alegria deve ter invadido, não sei. Até hoje não sei bem.

Hoje foi assim. Depois de reunião, de horas de bar, pedi pra ele me mandar uma música triste - muito triste, eu disse. Como se eu soubesse que, no fundo, ele ia saber escolher as canções mais tristes e eu queria mesmo achar espaço pro sofrimento. Talvez tenha sido o uísque.

E aí fomos falando sobre as tristezas mais ou menos assim:

- mas isso foi meio triste de mais, hein?
- seria triste se tristeza fosse para sempre. mas tristeza vem e passa

...

- estou ouvindo a música.
- eu gosto do final: "eu voltei foi para te dar uma rosa. e também queria te dar uma rosa (...) pensei em te dar uma rosa. ou melhor: um armário. armário cheio de gavetas. gavetas cheias de rosas".

E então eu vim escrever. A conversa parou abruptamente porque, ele sabe, eu precisava mesmo escrever. Acontece às vezes.

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