sexta-feira, abril 3

:: Para reciclar

Algumas relações parecem que passam, mas não. Existe alguma coisa, em algum lugar que não sei explicar, que faz os contatos ressurgirem da maneira mais mágica. Com o Vincent foi assim. Nos conhecemos em NY e grudamos horrores por lá. Ele é um baby de 22 anos, adora a dupla cerveja + cigarro e faz o tipo rebelde. Mas não. Ele é delicado, educado e inteligente. Bastou um dia de aula em NY. Na classe, vários orientais (vá-ri-os) e nós dois, isso antes do Joan chegar. Fazíamos todas as duplas e depois íamos almoçar juntos e andar pela cidade, sempre naquele inglês duro de entender.

Essa é a parte que mais gosto. A parte da comunicação. Foi depois de conhece-lo (ele e o Joan) que percebi o quanto a língua nem importa quando existe alguma afinidade entre as pessoas. A gente passava horas falando errado e era incrível como fluía. Quando a viagem acabou, trocamos alguns e-mails. Ele de Paris, onde nasceu e vive até hoje. Eu do Brasil, de onde quero ir embora quando der. Quando cheguei em Paris nos falamos e eu guardei minha penúltima noite para vê-lo. E foi mesmo o que eu poderia chamar de mágico. Especial. Inesquecível talvez. São essas histórias que a gente nem quer esquecer mesmo. E nem vai.

Nos encontramos na saída do metrô Abbesses, em Montmartre. Montmartre é o bairro dos boêmios, onde os artistas se reuniam - e ainda se reúnem, para criar. É o bairro dos bares de jazz e dos bares de não-jazz também. O bairro das ruas pequenas e do bar da Amelie Poulain. Também é o bairro do Moulin Rouge e do gato preto que mais amo. Comprei cartões e tudo.








Então fomos caminhando pelo lado A, onde topamos com um monte de turistas, e, depois, pelo lado B, onde não topamos nem com os franceses. A gente foi caminhando meio naquele esquema de "Antes do pôr-do-sol", sabe? Mas sem a coisa do amor arrebatador. Ele ia me mostrando onde Renoir pintava (uma pracinha linda, que hoje tem uns restaurantes fofos), o bar que Duke Ellington tocava, e me mostrou uma produção pequetucha de uvas (um vinhedinho micro) no meio do bairro e explicou que as uvas dali são usadas pra fazer um vinho específico para uma festa da cidade. Me mostrou ainda a menor rua de Paris, que não tem nem número e é uma coisa fofa. E outra sem saída com pequenas árvores e casas que parecem de brinquedo. Paramos num lugar incrível uma hora e ele explicou que ali era o melhor lugar para estar no dia mundial da música. Que a cidade inteira fica incrível, mas ali era o melhor canto. Ai.






E a gente falava sem parar. E era engraçado quando as palavras fugiam e a gente tinha de parar, respirar e recomeçar de outra forma até o outro entender. E a gente super se entendia. Quando fomos parar para um café, que na verdade era um chope, ele me levou num lugar que eu desacreditei. A rua tinha milhões de bares e cafés. Mi-lhões. E ele me levou justo num que chama Zebrè, com umas zebrinhas fofas espalhadas. E eu sou louca por zebras. E o bar era charmosinho, alternativo, com um senhor sorridente (mas nem tanto) que tirava chope bem na minha frente, porque sentamos no balcão, nas banquetas de veludo vermelho meio vintages. E eu adoro.








Antes de reparar nas zebrinhas fui tomada pela música. Sempre é assim. Pisei lá dentro e estava tocando minha música predileta do Jimi Hendrix e criava todo um clima. "Crosstown Traffic". Depois, fiquei passada, mas tocou ""If You Want to Say". com Sly and the Family Stone, e ele ficou prestando atenção enquanto eu cantava baixinho. Gostou tanto, que fiquei de gravar um disco pra ele. Mais: ao estilo francesinho, tivemos Serge Gainsbourg e ele até anotou no meu caderno o nome da música, que, desta vez, quem não conhecia era eu. A gente tem disso. Quando estávamos em NY ele escreveu uma lista de músicas e artistas que eu devia procurar e eu colei no meu caderno de viagem e tenho até hoje - e pra sempre.

Algumas coisas têm mesmo de ser assim: pra sempre. Mas nunca se sabe.

2 comentários:

Kaísa Isabel disse...

Adorei...me fez lembrar que tenho um "distância não importa" que eu adoro também.

Unknown disse...

Luluca,
Montmartre é mágico, e assim com a magia, basta acreditar que ela existe para tudo acontecer.
Bjks