:: Pequenas alegrias
Hoje ela mandou Cora Coralina por e-mail...
SABER VIVER
“Não sei se a vida é curta ou longa demais pra nós, mas sei que nada do que vivemos tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas. Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.
E isso não é coisa do outro mundo, é o que dá sentido à vida. É o que faz com que ela não seja curta, nem longa demais, mas que seja intensa, verdadeira, pura, enquanto durar.”
Cora Coralina
quarta-feira, dezembro 29
terça-feira, dezembro 28
domingo, dezembro 26
:: Quando a gente cresce
Quando a gente cresce, a gente aprende se presentear. Pelo menos foi assim comigo. De uns tempos pra cá adotei esse costume eventual de me agradar.
Hoje, louca, eu tinha seis amigos para receber para o almoço e, mesmo assim, antes de tudo, fui à Livraria da Vila aproveitar os 20% de desconto no acervo inteiro, ritual que já virou tradição nos meus pós-natais.
Verdade que isso é um pouco cabeça de quem vive duro e adora uma promoção. Mas olha a alegria: voltar pra casa com discos novos, aos montes. Hoje foi meu primeiro dia lá (costumo ir mais de uma vez, para a pausa pro meu expresso curto de sempre lá nos fundos, sob as àrvores que tanto gosto). Já voltei com Alice Coltrane, Benny Goodman, Coleman Hawkins e dois Caetanos.
Quando a gente cresce, a gente aprende se presentear. Pelo menos foi assim comigo. De uns tempos pra cá adotei esse costume eventual de me agradar.
Hoje, louca, eu tinha seis amigos para receber para o almoço e, mesmo assim, antes de tudo, fui à Livraria da Vila aproveitar os 20% de desconto no acervo inteiro, ritual que já virou tradição nos meus pós-natais.
Verdade que isso é um pouco cabeça de quem vive duro e adora uma promoção. Mas olha a alegria: voltar pra casa com discos novos, aos montes. Hoje foi meu primeiro dia lá (costumo ir mais de uma vez, para a pausa pro meu expresso curto de sempre lá nos fundos, sob as àrvores que tanto gosto). Já voltei com Alice Coltrane, Benny Goodman, Coleman Hawkins e dois Caetanos.
sábado, dezembro 25
:: As playlists sob medida
Fazia tempo que queria gravar umas canções pra ela. Desde que voltou de Paris, acho. Antes de ir, lembro, gravei um tanto de discos. E ela me contou, dia desses, que hoje são músicas que a lembram da cidade das luzes. Agora pensei em juntar músicas brasileiras que me marcaram neste ano dos infernos. Músicas para que ela fique aqui, perto de mim. Então escolhi musiquinhas da Lulina, do Jeneci, da Tulipa, aos montes. No disco dois, tem ainda Lettuce, Karina Buhr (que peguei um pouco de birra no último show, verdade), Lucas Santtana, Eduardo Nazarian, com "Quem Vem Lá", que amo, amo. Tem mais: Junio Barreto, Mallu Magalhães, Andreia Dias, Leo Cavalcanti, Cibelle, Kassin + 2. Estou esperando as primeiras impressões. Ansiosa. Ela sabe. Costumo ficar ansiosa com amizades musicais e verdadeiras - e pra sempre.
Fazia tempo que queria gravar umas canções pra ela. Desde que voltou de Paris, acho. Antes de ir, lembro, gravei um tanto de discos. E ela me contou, dia desses, que hoje são músicas que a lembram da cidade das luzes. Agora pensei em juntar músicas brasileiras que me marcaram neste ano dos infernos. Músicas para que ela fique aqui, perto de mim. Então escolhi musiquinhas da Lulina, do Jeneci, da Tulipa, aos montes. No disco dois, tem ainda Lettuce, Karina Buhr (que peguei um pouco de birra no último show, verdade), Lucas Santtana, Eduardo Nazarian, com "Quem Vem Lá", que amo, amo. Tem mais: Junio Barreto, Mallu Magalhães, Andreia Dias, Leo Cavalcanti, Cibelle, Kassin + 2. Estou esperando as primeiras impressões. Ansiosa. Ela sabe. Costumo ficar ansiosa com amizades musicais e verdadeiras - e pra sempre.
terça-feira, dezembro 21
sábado, dezembro 18
:: As cartas de amor
Fui ler umas velharias e então achei uma carta que ele me mandou num fim de ano do passado. Me fez tanto sentido que rabisquei aqui umas ideias.
Ah, Lu, me dei conta que não sei bem qual será o meu destino no ano que vem. Uma amiga minha está de mudança para Brasilia. Nem é tão longe, mas é que é uma distância real mesmo. Eu também estou planejando sair do Brasil no final do ano. Preciso de tempo para respirar diferente.
Foi aí que me dei conta como a gente anda afastado e como havíamos prometido não nos afastar muito este ano. Não consigo imaginar planos ou estratagemas que pudéssemos ter para enganar essa minha saudade.
Gostaria de ter dito isso pessoalmente.
Fui ler umas velharias e então achei uma carta que ele me mandou num fim de ano do passado. Me fez tanto sentido que rabisquei aqui umas ideias.
Ah, Lu, me dei conta que não sei bem qual será o meu destino no ano que vem. Uma amiga minha está de mudança para Brasilia. Nem é tão longe, mas é que é uma distância real mesmo. Eu também estou planejando sair do Brasil no final do ano. Preciso de tempo para respirar diferente.
Foi aí que me dei conta como a gente anda afastado e como havíamos prometido não nos afastar muito este ano. Não consigo imaginar planos ou estratagemas que pudéssemos ter para enganar essa minha saudade.
Gostaria de ter dito isso pessoalmente.
:: Uma queda pelos clássicos
Sempre tive uma queda pelos clássicos. Não vou esquecer jamais dos fins de semana em que minha avó tocava Bach ao piano, com pedais e tudo, enquanto eu escrevia no diário, esparramada no chão da sala, tomando chá de cidreira. Quando entrei para a aula de piano impliquei com a professora que implicou com as minhas unhas roídas. Quando ela disse ou as unhas roídas ou o piano, fiquei com o piano. Mas, pouco depois, de unhas bonitinhas e tudo, ela disse que não ia me ensinar piano clássico. Só popular. E lá fui eu tocar "Água Branca" e cia. Uma chatice. Eu, que queria tocar as mais lindas canções clásscias e estudar incansavelmente, tive de tocar as populares de sempre. Parei o piano, depois. Desiludida. Até hoje sinto certa desilusão por isso.
Quando eu era uma pequena adolescente tive um amor platônico que também não vou esquecer. Íamos os melhores amigos todos na casa do avô de um dos amigos. Uma casa numa selva, em plena São Paulo, com uma escultura barroca num jardim de antigamente, com a grama verde, brilhante e incrivelmente aparada. O avô, pensa, nos deixava ficar na piscina e, lá pelas tantas, nos servia champanhe e caviar. Champanhe, uma tacinha, e caviar. Foi a primeira vez que provei um e outro.
Enquanto isso, o primo desse amigo não saía daquela sala espaçosa, que dava vista para o jardim, separados por uma enorme porta de vidro de correr. Ele não saía de lá de jeito nenhum. Ficava a tocar músicas clássicas naquele belíssimo piano de cauda. À exaustão. E eu, entretida. Desviava toda a atenção dos amigos juvenis da piscina, a brincar incansavelmente. Eu ficava ali de olho naquele primo mais velho, de nome bonito e mãos com dedos alongados.
Um pouco antes dessa fase, quando eu era bem menor, papai tomou o hábito de acordar a mim e a Li com música. Pianos e violinos clássicos, sem muitos sobressaltos, para que a gente não ficasse atordoada já pela manhã. Ele aumentava o som na sala, abria a porta do nosso quarto e abria a janela, sem falar nada. E a gente acordava.
Bem, e então, nos tempos de hoje, soube que aquela linda menina, de traços angelicais, olhos azuis, cabelos louros, dedos longos, nariz delicado, que conheço desde a infância, sem muita proximidade, foi convidada para ir para o Inhotim para uma missão e tanto. Ela, que dá sua vida ao piano, foi ao Inhotim virar as partituras para uma pianista clásscia que veio do Japão tocar aqui.
Fiquei com isso na cabeça.
E hoje, nessa manhã cinzenta, um pouco impregnada de tristeza, estava lendo Ian McEwan e ele começa a descrever uma de suas personagens. Florence morava num albergue severo, no qual as luzes de apagavam pontualmente às 23h, visitantes homens eram proibidos a qualquer hora. Ela praticava quatro horas de piano por dia e ia a concertos com as amigas.
Gostava, particularmente, dos concertos de câmara num lugar de "paredes desbotadas e descascadas", "o madeiramento envernizado" e o "tapete vermelho escuro do hall de entrada", o "auditório com a forma de um túnel dourado". Olha essa cena, que linda: "Ela reverenciava os velhos tipos, que levavam minutos para descer dos táxis, coxeando com suas bengalas até suas cadeiras, para escutar música num silêncio crítico e alerta, às vezes com a manta xadrez que traziam a cobrir-lhes os joelhos."
Passado um tempo, ela recebeu uma proposta de emprego de meio período nos bastidores. "Tinha de servir chá aos intérpretes na espaçosa sala verde e ficar de espreita na vigia para poder abrir a porta quando os artistas saíam do palco. Também podia virar as páginas para os pianistas em peças de câmara."
Fiquei com esse treco na cabeça. Vim então aqui passar os meus discos de Mozart, Bach, Beethoven e Vivaldi para o computador, depois para o iPod. E agora estou escrevendo enquanto ouço um pouco de tudo. Num cenário menos romântico, troquei o chá de cidreira por uma Coca zero gelada.
Sempre tive uma queda pelos clássicos. Não vou esquecer jamais dos fins de semana em que minha avó tocava Bach ao piano, com pedais e tudo, enquanto eu escrevia no diário, esparramada no chão da sala, tomando chá de cidreira. Quando entrei para a aula de piano impliquei com a professora que implicou com as minhas unhas roídas. Quando ela disse ou as unhas roídas ou o piano, fiquei com o piano. Mas, pouco depois, de unhas bonitinhas e tudo, ela disse que não ia me ensinar piano clássico. Só popular. E lá fui eu tocar "Água Branca" e cia. Uma chatice. Eu, que queria tocar as mais lindas canções clásscias e estudar incansavelmente, tive de tocar as populares de sempre. Parei o piano, depois. Desiludida. Até hoje sinto certa desilusão por isso.
Quando eu era uma pequena adolescente tive um amor platônico que também não vou esquecer. Íamos os melhores amigos todos na casa do avô de um dos amigos. Uma casa numa selva, em plena São Paulo, com uma escultura barroca num jardim de antigamente, com a grama verde, brilhante e incrivelmente aparada. O avô, pensa, nos deixava ficar na piscina e, lá pelas tantas, nos servia champanhe e caviar. Champanhe, uma tacinha, e caviar. Foi a primeira vez que provei um e outro.
Enquanto isso, o primo desse amigo não saía daquela sala espaçosa, que dava vista para o jardim, separados por uma enorme porta de vidro de correr. Ele não saía de lá de jeito nenhum. Ficava a tocar músicas clássicas naquele belíssimo piano de cauda. À exaustão. E eu, entretida. Desviava toda a atenção dos amigos juvenis da piscina, a brincar incansavelmente. Eu ficava ali de olho naquele primo mais velho, de nome bonito e mãos com dedos alongados.
Um pouco antes dessa fase, quando eu era bem menor, papai tomou o hábito de acordar a mim e a Li com música. Pianos e violinos clássicos, sem muitos sobressaltos, para que a gente não ficasse atordoada já pela manhã. Ele aumentava o som na sala, abria a porta do nosso quarto e abria a janela, sem falar nada. E a gente acordava.
Bem, e então, nos tempos de hoje, soube que aquela linda menina, de traços angelicais, olhos azuis, cabelos louros, dedos longos, nariz delicado, que conheço desde a infância, sem muita proximidade, foi convidada para ir para o Inhotim para uma missão e tanto. Ela, que dá sua vida ao piano, foi ao Inhotim virar as partituras para uma pianista clásscia que veio do Japão tocar aqui.
Fiquei com isso na cabeça.
E hoje, nessa manhã cinzenta, um pouco impregnada de tristeza, estava lendo Ian McEwan e ele começa a descrever uma de suas personagens. Florence morava num albergue severo, no qual as luzes de apagavam pontualmente às 23h, visitantes homens eram proibidos a qualquer hora. Ela praticava quatro horas de piano por dia e ia a concertos com as amigas.
Gostava, particularmente, dos concertos de câmara num lugar de "paredes desbotadas e descascadas", "o madeiramento envernizado" e o "tapete vermelho escuro do hall de entrada", o "auditório com a forma de um túnel dourado". Olha essa cena, que linda: "Ela reverenciava os velhos tipos, que levavam minutos para descer dos táxis, coxeando com suas bengalas até suas cadeiras, para escutar música num silêncio crítico e alerta, às vezes com a manta xadrez que traziam a cobrir-lhes os joelhos."
Passado um tempo, ela recebeu uma proposta de emprego de meio período nos bastidores. "Tinha de servir chá aos intérpretes na espaçosa sala verde e ficar de espreita na vigia para poder abrir a porta quando os artistas saíam do palco. Também podia virar as páginas para os pianistas em peças de câmara."
Fiquei com esse treco na cabeça. Vim então aqui passar os meus discos de Mozart, Bach, Beethoven e Vivaldi para o computador, depois para o iPod. E agora estou escrevendo enquanto ouço um pouco de tudo. Num cenário menos romântico, troquei o chá de cidreira por uma Coca zero gelada.
sábado, dezembro 11
sexta-feira, dezembro 10
:: Diálogos
Ela
Eu
"Toda a existência humana decorre do binômio Estômago e Sexo. A Fome o e Amor governam o mundo, afirmava Schiller." (Câmara Cascudo, em "História da Alimentação no Brasil")
Ela
"Parece-me, diz ela, que nossas três necessidades básicas, a comida, a segurança e o amor, estão misturadas e unidas e entrelaçadas, que não podemos pensar diretamente em uma sem pensar nas outras ...." (M.F.K. Fisher)
Ela
Eu
"Toda a existência humana decorre do binômio Estômago e Sexo. A Fome o e Amor governam o mundo, afirmava Schiller." (Câmara Cascudo, em "História da Alimentação no Brasil")
Ela
"Parece-me, diz ela, que nossas três necessidades básicas, a comida, a segurança e o amor, estão misturadas e unidas e entrelaçadas, que não podemos pensar diretamente em uma sem pensar nas outras ...." (M.F.K. Fisher)
quinta-feira, dezembro 9
:: Inspirações matinais
Hoje, pela manhã, muito cedo, teve toda a andança até a ponte do Jaguaré para compromissos com o automóvel _e com o governo. Bem, depois disso, uma fórmula para recuperar o humor matinal, que me é peculiar.
Um café preparado na mesa em que eu estava sentada, no Coffee Lab, na AeroPress. Meu café predileto, sempre. A delicada textura do café coado, livre de qualquer resíduo, com a complexidade de aromas e sabor de um expresso. Enquanto isso, reli um ou outro trecho de "Açúcar", do Gilberto Freyre. Coisa boa sempre.
Depois, ouvi os Jenecis que consegui baixar, enquanto o disco não chega (o disco que não chega nunca - e o que eu faço com a minha ansiedade?). Já no jornal, tinha e-mail dele, falando que colocou as músicas dos discos que gravei outro dia especialmente pra ele no repeat.
Hoje, pela manhã, muito cedo, teve toda a andança até a ponte do Jaguaré para compromissos com o automóvel _e com o governo. Bem, depois disso, uma fórmula para recuperar o humor matinal, que me é peculiar.
Um café preparado na mesa em que eu estava sentada, no Coffee Lab, na AeroPress. Meu café predileto, sempre. A delicada textura do café coado, livre de qualquer resíduo, com a complexidade de aromas e sabor de um expresso. Enquanto isso, reli um ou outro trecho de "Açúcar", do Gilberto Freyre. Coisa boa sempre.
Depois, ouvi os Jenecis que consegui baixar, enquanto o disco não chega (o disco que não chega nunca - e o que eu faço com a minha ansiedade?). Já no jornal, tinha e-mail dele, falando que colocou as músicas dos discos que gravei outro dia especialmente pra ele no repeat.
:: Os cartões de Natal e Ano Novo
Todo ano aqui é assim: são enxurradas de e-mails de feliz Natal e Ano Novo. Panetones aos montes, vinhos, livros e cartões, muitos cartões. Bem, isso é praxe das assessorias e alguns de seus clientes o que torna a coisa meio repetitiva e num tom de obrigatoriedade, apesar de gentil.
E então que hoje recebi um cartão do Felipe, da Martins Fontes, que eu até recortei para colar em algum lugar. Ao lado das felicitações corriqueiras, uma citação de "Don Quijote de la Mancha", de Cervantes, que adorei:
"...qualquer parte que se leia, de qualquer livro de cavalaria andante, há de causar gosto e encantamento a quem ler. Creia-se, vossa mercê, como já lhe disse outra vez: leia esses livros e verá que afastarão sua melancolia, se porventura estiver melancólico, e animarão seu humor, se o tiver desfavorável."
Que venha 2011. E logo.
Todo ano aqui é assim: são enxurradas de e-mails de feliz Natal e Ano Novo. Panetones aos montes, vinhos, livros e cartões, muitos cartões. Bem, isso é praxe das assessorias e alguns de seus clientes o que torna a coisa meio repetitiva e num tom de obrigatoriedade, apesar de gentil.
E então que hoje recebi um cartão do Felipe, da Martins Fontes, que eu até recortei para colar em algum lugar. Ao lado das felicitações corriqueiras, uma citação de "Don Quijote de la Mancha", de Cervantes, que adorei:
"...qualquer parte que se leia, de qualquer livro de cavalaria andante, há de causar gosto e encantamento a quem ler. Creia-se, vossa mercê, como já lhe disse outra vez: leia esses livros e verá que afastarão sua melancolia, se porventura estiver melancólico, e animarão seu humor, se o tiver desfavorável."
Que venha 2011. E logo.
:: Leituras de antigamente
Os clássicos sempre, sempre me trouxeram algum sentimento que não sei bem explicar. É como se eu conseguisse me transportar para antigamente _e me isolar do presente. Outro dia senti uma coisa maluca lendo Gregório de Matos, nosso poeta "Boca do Inferno".
Achei um livro de 1981 sobre sua obra, com poemas comentados por Antônio Dimas. Foi lindo. Andava louca atrás desse livro e só achava em sebos. Ai, os sebos. Adoro meu ritual das livrarias. Mas me dá uma alegria enorme quando estou atrás de um livro antigo, não acho em canto algum e, de repente, encontro num sebo virtual, faço o pagamento da maneira mais simples e, dias depois, a obra está bem aqui, na portaria da minicasa, a me esperar.
Dessa vez foi diferente. Minha ansiedade foi tanta que resolvi arriscar uma pesquisa na biblioteca do jornal, meio sem esperança. E achei. Já estou com a parte da obra que me interessa devidamente xerocada e grifada. Lendo tudo sobre os relatos de Gregório de Matos sobre o Carnaval de antigamente e sua orgia gastronômica lá no Brasil seiscentista. Coisa linda.
Os clássicos sempre, sempre me trouxeram algum sentimento que não sei bem explicar. É como se eu conseguisse me transportar para antigamente _e me isolar do presente. Outro dia senti uma coisa maluca lendo Gregório de Matos, nosso poeta "Boca do Inferno".
Achei um livro de 1981 sobre sua obra, com poemas comentados por Antônio Dimas. Foi lindo. Andava louca atrás desse livro e só achava em sebos. Ai, os sebos. Adoro meu ritual das livrarias. Mas me dá uma alegria enorme quando estou atrás de um livro antigo, não acho em canto algum e, de repente, encontro num sebo virtual, faço o pagamento da maneira mais simples e, dias depois, a obra está bem aqui, na portaria da minicasa, a me esperar.
Dessa vez foi diferente. Minha ansiedade foi tanta que resolvi arriscar uma pesquisa na biblioteca do jornal, meio sem esperança. E achei. Já estou com a parte da obra que me interessa devidamente xerocada e grifada. Lendo tudo sobre os relatos de Gregório de Matos sobre o Carnaval de antigamente e sua orgia gastronômica lá no Brasil seiscentista. Coisa linda.
quarta-feira, dezembro 8
:: As letras atrasadas
Sem mais delongas, aqui vão as letras atrasadas do nosso querido "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch.
N
namorado - é uma pessoa que tem medo do claro
namorado - o meu namorado tem iniciativa. o que ele não tem é acabativa.
O
ódio - é sujeira da alma
opinião - gente que não gosta de sorvete não pode prestar. gente que gosta de jiló. então... vai ver que nem é gente
P
pai - ser pai é mais difícil que ser mãe. pai precisa usar gravata
palavra - tem adulto que fecha a palavra da criança
palavra - tem palavra que nem devia existir. urubu, por exemplo
palhaço - é um homem todo pintado de piadas
pão - não sei por que na reza só se pede o "pão nosso". na minha reza eu peço bife com batata frita e até sobremesa
pão duro - é uma pessoa que não gasta nem pensamento
passa - é uma uva morta
pensamento - é uma coisa que só dá na cabeça, né?
pensamento - a coisa que mais dói no mundo é pensamento
pessoa boa - é aquela que não tem nem um limãozinho dentro dela
pintura - "não gosta do meu quadro? é que a senhora nunca viu pintura moderna"
prato - o prato que eu mais gosto nem é prato. é camarão no espeto
presente - o presente que eu quero ganhar quando você viajar papai... é você nem viajar. fica comigo?
psicóloga - mamãe me mandou pra pscicóloga e, depois da minha sessão, eu acho que a psicóloga melhorou
Q
(não teve prediletos aqui na letra "q")
Sem mais delongas, aqui vão as letras atrasadas do nosso querido "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch.
N
namorado - é uma pessoa que tem medo do claro
namorado - o meu namorado tem iniciativa. o que ele não tem é acabativa.
O
ódio - é sujeira da alma
opinião - gente que não gosta de sorvete não pode prestar. gente que gosta de jiló. então... vai ver que nem é gente
P
pai - ser pai é mais difícil que ser mãe. pai precisa usar gravata
palavra - tem adulto que fecha a palavra da criança
palavra - tem palavra que nem devia existir. urubu, por exemplo
palhaço - é um homem todo pintado de piadas
pão - não sei por que na reza só se pede o "pão nosso". na minha reza eu peço bife com batata frita e até sobremesa
pão duro - é uma pessoa que não gasta nem pensamento
passa - é uma uva morta
pensamento - é uma coisa que só dá na cabeça, né?
pensamento - a coisa que mais dói no mundo é pensamento
pessoa boa - é aquela que não tem nem um limãozinho dentro dela
pintura - "não gosta do meu quadro? é que a senhora nunca viu pintura moderna"
prato - o prato que eu mais gosto nem é prato. é camarão no espeto
presente - o presente que eu quero ganhar quando você viajar papai... é você nem viajar. fica comigo?
psicóloga - mamãe me mandou pra pscicóloga e, depois da minha sessão, eu acho que a psicóloga melhorou
Q
(não teve prediletos aqui na letra "q")
sábado, dezembro 4
:: A letra "M"
(os prediletos da letra "m", do "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch, para começar o fim de semana)
mãe - se eu fosse mãe, me dava uma coca-cola
mãe - mas você é uma mãe desalmada, mesmo. como é que se acorda uma criança de seis anos como eu, pra ir pra escola a essa hora?
máquina - o papai comprou um fogão de lavar roupa
milagre - é macaco virando gente. dá pra acreditar?
melhor - o melhor aluno da turma, pra mim, é o Valtinho. melhor porque ele paga o meu sorvete
menino - é uma criança que nasce completa
mentira - quando o telefone toca e papai manda dizer que não está, não é mentira. é recado
mentira - é uma coisa que depende. quando você diz a uma pessoa muito feia que ela é bonita, aí não é mentira. é caridade.
mundo - aprendi que mundo quer dizer limpo. imundo quer dizer sujo.
música - é uma coisa que faz muita falta quando o rádio está sem pilha e o som está sem tomada
(os prediletos da letra "m", do "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch, para começar o fim de semana)
mãe - se eu fosse mãe, me dava uma coca-cola
mãe - mas você é uma mãe desalmada, mesmo. como é que se acorda uma criança de seis anos como eu, pra ir pra escola a essa hora?
máquina - o papai comprou um fogão de lavar roupa
milagre - é macaco virando gente. dá pra acreditar?
melhor - o melhor aluno da turma, pra mim, é o Valtinho. melhor porque ele paga o meu sorvete
menino - é uma criança que nasce completa
mentira - quando o telefone toca e papai manda dizer que não está, não é mentira. é recado
mentira - é uma coisa que depende. quando você diz a uma pessoa muito feia que ela é bonita, aí não é mentira. é caridade.
mundo - aprendi que mundo quer dizer limpo. imundo quer dizer sujo.
música - é uma coisa que faz muita falta quando o rádio está sem pilha e o som está sem tomada
sexta-feira, dezembro 3
:: Os livros, as lembranças
Hoje amanheci bem cedo para mexer nos livros de comida. Há um, dois dias adiei esse momento. Para mexer com os livros, eu preciso de tempo. Então selecionei todos aqueles quatro ou cinco que me interessavam e fiz uma lista de outros para comprar, onde posso caçar uma informação ou outra sobre o que preciso. Algo me desestruturou, no meio do caminho, e deixei os livros de lado. Peguei para folhear, mais uma vez, "Um Tratado da Cozinha Portuguesa do século XV". Na primeira página, a letra do meu avô, com uma dedicatória de 2002, antes de morrer. "Um dos meus guardados", dizia. Meu avô sempre foi um colecionador. Herdei essa mania dele. Ele colecionava obras de arte, livros e discos. Tudo devidamente catalogado. E esse, olha só, quando comecei a escrever de comida, ele me deu. Mas ele fazia muito mais. Ele imprimia todas as notas que eu escrevi lá no comecinho da carreira e, nos almoços de domingo, vinha com um punhado de papéis na mão, para mostrar meus feitos aos familiares. Um dia, me deu um mapa. Um mapa do mundo, desses que hoje a gente compra no farol. E disse: "Você é uma jornalista e precisa saber muito bem o mapa". Depois ele morreu. E eu joguei na cova, aos prantos, uma carta enorme de páginas e páginas. Queria conversar. Era isso. O que eu mais senti falta naquele dia do enterro foi de conversar longamente com ele. Então escrevi uma carta. Uma longa carta, como uma conversa. Como se ele estivesse ali perto de mim. Ele morreu e nem sabe que hoje ainda escrevo sobre comida, sou louca por livros, tenho "os guardados" dele comigo sempre, em destaque. Ele morreu e nem desconfia que, até hoje, ainda não aprendi bem a disposição dos países no mapa, dos oceanos, das ilhas. Mas hei de aprender. E, quem sabe, sento para escrever uma outra carta. Outra longa carta. Como uma conversa.
Hoje amanheci bem cedo para mexer nos livros de comida. Há um, dois dias adiei esse momento. Para mexer com os livros, eu preciso de tempo. Então selecionei todos aqueles quatro ou cinco que me interessavam e fiz uma lista de outros para comprar, onde posso caçar uma informação ou outra sobre o que preciso. Algo me desestruturou, no meio do caminho, e deixei os livros de lado. Peguei para folhear, mais uma vez, "Um Tratado da Cozinha Portuguesa do século XV". Na primeira página, a letra do meu avô, com uma dedicatória de 2002, antes de morrer. "Um dos meus guardados", dizia. Meu avô sempre foi um colecionador. Herdei essa mania dele. Ele colecionava obras de arte, livros e discos. Tudo devidamente catalogado. E esse, olha só, quando comecei a escrever de comida, ele me deu. Mas ele fazia muito mais. Ele imprimia todas as notas que eu escrevi lá no comecinho da carreira e, nos almoços de domingo, vinha com um punhado de papéis na mão, para mostrar meus feitos aos familiares. Um dia, me deu um mapa. Um mapa do mundo, desses que hoje a gente compra no farol. E disse: "Você é uma jornalista e precisa saber muito bem o mapa". Depois ele morreu. E eu joguei na cova, aos prantos, uma carta enorme de páginas e páginas. Queria conversar. Era isso. O que eu mais senti falta naquele dia do enterro foi de conversar longamente com ele. Então escrevi uma carta. Uma longa carta, como uma conversa. Como se ele estivesse ali perto de mim. Ele morreu e nem sabe que hoje ainda escrevo sobre comida, sou louca por livros, tenho "os guardados" dele comigo sempre, em destaque. Ele morreu e nem desconfia que, até hoje, ainda não aprendi bem a disposição dos países no mapa, dos oceanos, das ilhas. Mas hei de aprender. E, quem sabe, sento para escrever uma outra carta. Outra longa carta. Como uma conversa.
:: A letra "L" para uma sexta estranha
("Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch)
L
leão - tia, se o leão sair dessa jaula e comer a senhora, que ônibus eu tomo pra voltar pra casa?
leite - é suco de vaca
lembrança - aquele velho está com uma cara de quem está pensando no antigamente
leque - é um espanador de ventinho
línguas - já aprendi três palavras em francês: maison é casa, chaise é cadeira e thank you, que nem é francês
lógica - adulto é uma pessoa que não pensa. mamãe me comprou capa, chapéu, guarda-chuva e galocha e, agora, ão me deixa sair porque está chovendo. pode?
luto - a senhora não podia ficar triste de branco?
("Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch)
L
leão - tia, se o leão sair dessa jaula e comer a senhora, que ônibus eu tomo pra voltar pra casa?
leite - é suco de vaca
lembrança - aquele velho está com uma cara de quem está pensando no antigamente
leque - é um espanador de ventinho
línguas - já aprendi três palavras em francês: maison é casa, chaise é cadeira e thank you, que nem é francês
lógica - adulto é uma pessoa que não pensa. mamãe me comprou capa, chapéu, guarda-chuva e galocha e, agora, ão me deixa sair porque está chovendo. pode?
luto - a senhora não podia ficar triste de branco?
quinta-feira, dezembro 2
:: Caderno de notas
Tenho aquela mania obcessiva de tomar notas. De grifar os trechos prediletos dos livros. Já comecei com os dizeres do português. Até agora, juntei isso aqui:
"Quero comprar uma máquina que pense por mim"
"O mundo é claro e calmo e tem 24 horas.
De repente chega o desejo e estraga tudo"
"De resto tudo bem, se não fosse esta produção contínua de desespero.
Tenho uma fábrica de desespero debaixo da língua.
Por isso falo tão pouco"
"Vou mostrar-lhe que além de mentir também sei dançar"
(Gonçalo M. Tavares)
Tenho aquela mania obcessiva de tomar notas. De grifar os trechos prediletos dos livros. Já comecei com os dizeres do português. Até agora, juntei isso aqui:
"Quero comprar uma máquina que pense por mim"
"O mundo é claro e calmo e tem 24 horas.
De repente chega o desejo e estraga tudo"
"De resto tudo bem, se não fosse esta produção contínua de desespero.
Tenho uma fábrica de desespero debaixo da língua.
Por isso falo tão pouco"
"Vou mostrar-lhe que além de mentir também sei dançar"
(Gonçalo M. Tavares)
:: Três letras em um dia
(do "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch)
H
histórias - as histórias que meu pai conta são tão curtas que parecem anúncios
homem - eu sou é homem. como é que eu sei? se eu não fosse homem, eu ia me chamar gilberto?
I
ilha - é um morro que caiu no mar
inglês - a única palavra que sei em inglês é "tchau"
inteligência - eu sou inteligente porque eu sei que sou inteligente. nenhum menino bobo sabe que é bobo
inteligência - ele não é inteligente. ele diz as palavras, mas não diz os pensamentos
irmãozinho - tô feliz que ganhei um irmãozinho, mas prefiro vídeo game
J
jardim zoológico - o bicho que eu mais gostei, no jardim zoológico, foi o vendedor de sorvete
(do "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch)
H
histórias - as histórias que meu pai conta são tão curtas que parecem anúncios
homem - eu sou é homem. como é que eu sei? se eu não fosse homem, eu ia me chamar gilberto?
I
ilha - é um morro que caiu no mar
inglês - a única palavra que sei em inglês é "tchau"
inteligência - eu sou inteligente porque eu sei que sou inteligente. nenhum menino bobo sabe que é bobo
inteligência - ele não é inteligente. ele diz as palavras, mas não diz os pensamentos
irmãozinho - tô feliz que ganhei um irmãozinho, mas prefiro vídeo game
J
jardim zoológico - o bicho que eu mais gostei, no jardim zoológico, foi o vendedor de sorvete
quarta-feira, dezembro 1
:: Aconchego
Ele agora tem essa mania adorável de me dar flores. Outro dia chegou com um arranjo tão voltuoso que, na manhã seguinte, dividi em três vasos, inclusive um para o banheiro, onde gosto sempre de deixar um colorido para as visitas. Nesta semana, não. As flores até murcharam. Nesta semana, ele comprou um livro. Dois. Um pra ele, outro igual pra mim. Um livro do português Gonçalo M. Tavares, com poemas. Livro daqueles que a gente acomoda na nossa mesinha de cabeceira para folhear antes de dormir, quando está triste ou feliz. Quando está sem sono ou quando está sonada. Ele sabe como eu gosto das palavras. Ele diz que prefere a forma das letras, mas acho que gosta das palavras também. Talvez pelas formas das letras...? Na dedicatória, escreve que não é bom com as palavras "mas tem gente que é", disse. Achei lindo. Ele é bom com essas delicadezas inesperadas.
Ele agora tem essa mania adorável de me dar flores. Outro dia chegou com um arranjo tão voltuoso que, na manhã seguinte, dividi em três vasos, inclusive um para o banheiro, onde gosto sempre de deixar um colorido para as visitas. Nesta semana, não. As flores até murcharam. Nesta semana, ele comprou um livro. Dois. Um pra ele, outro igual pra mim. Um livro do português Gonçalo M. Tavares, com poemas. Livro daqueles que a gente acomoda na nossa mesinha de cabeceira para folhear antes de dormir, quando está triste ou feliz. Quando está sem sono ou quando está sonada. Ele sabe como eu gosto das palavras. Ele diz que prefere a forma das letras, mas acho que gosta das palavras também. Talvez pelas formas das letras...? Na dedicatória, escreve que não é bom com as palavras "mas tem gente que é", disse. Achei lindo. Ele é bom com essas delicadezas inesperadas.
:: A curiosidade de uma mulher
Ou será um interesse extremo pelas coisas? Hoje me perguntei isso uma, duas vezes. Pra dentro de mim. No transporte coletivo (!), bem cedinho, me esmagava entre um e outro com o jornal aberto, numa tentativa inútil de ler algumas linhas. Depois, sentei. Por isso fui capaz de devorar a coluna do Marcelo Coelho, pela segunda semana seguida. Digo, pela segunda semana seguida que li com mais voracidade. Ele falava, de algum jeito, de comida.
Hoje, conta sobre o concurso de redações escolares no qual participaram 7 milhões de alunos da rede pública, entre 13 e 17 anos. E então comenta sobre uma ou outra, que ele mesmo leu, como júri da etapa final, em que sobraram 150 textos.
Olha que linda a forma como ele escreve, lá pelas tantas:
"Os concorrentes vinham dos lugares mais improváveis. A cidade de Formiga, em Minas Gerais, era das poucas de que já tinha ouvido falar.
Vitória do Xingu (PA), Carrapateira (PB), Nova Alvorada do Sul (MS), Vila Paixão (ES): em cada lugar desses, há um adolescente escrevendo coisa com coisa, citando Clarice Lispector (1920-1977) ou Carlos Drummond (1902-1987), pesando os prós e os contras da colheita mecanizada na lavoura do café ou analisando o impacto da construção de uma barragem.
Nas crônicas, nos artigos de opinião e nos registros do passado feitos por meio de entrevistas com idosos, tem-se um vislumbre da realidade brasileira. Cidades que se formam em poucos anos e se dedicam à exportação de mexerica. Crianças que, depois de estudar, ajudam na colheita do chuchu."
***
Agora, sobre a curiosidade. Quero ler essas redações. Quero muito. Quero tanto que chego a sentir uma ansiedade ruim de sentir. Depois, me perguntei se não era um interesse extremo pelas coisas simples. Acho que é.
Ou será um interesse extremo pelas coisas? Hoje me perguntei isso uma, duas vezes. Pra dentro de mim. No transporte coletivo (!), bem cedinho, me esmagava entre um e outro com o jornal aberto, numa tentativa inútil de ler algumas linhas. Depois, sentei. Por isso fui capaz de devorar a coluna do Marcelo Coelho, pela segunda semana seguida. Digo, pela segunda semana seguida que li com mais voracidade. Ele falava, de algum jeito, de comida.
Hoje, conta sobre o concurso de redações escolares no qual participaram 7 milhões de alunos da rede pública, entre 13 e 17 anos. E então comenta sobre uma ou outra, que ele mesmo leu, como júri da etapa final, em que sobraram 150 textos.
Olha que linda a forma como ele escreve, lá pelas tantas:
"Os concorrentes vinham dos lugares mais improváveis. A cidade de Formiga, em Minas Gerais, era das poucas de que já tinha ouvido falar.
Vitória do Xingu (PA), Carrapateira (PB), Nova Alvorada do Sul (MS), Vila Paixão (ES): em cada lugar desses, há um adolescente escrevendo coisa com coisa, citando Clarice Lispector (1920-1977) ou Carlos Drummond (1902-1987), pesando os prós e os contras da colheita mecanizada na lavoura do café ou analisando o impacto da construção de uma barragem.
Nas crônicas, nos artigos de opinião e nos registros do passado feitos por meio de entrevistas com idosos, tem-se um vislumbre da realidade brasileira. Cidades que se formam em poucos anos e se dedicam à exportação de mexerica. Crianças que, depois de estudar, ajudam na colheita do chuchu."
***
Agora, sobre a curiosidade. Quero ler essas redações. Quero muito. Quero tanto que chego a sentir uma ansiedade ruim de sentir. Depois, me perguntei se não era um interesse extremo pelas coisas simples. Acho que é.
terça-feira, novembro 30
:: Homenagem
Não é de hoje que temos algo muito em comum. E é um pouco inexplicável, acho, a sensação de se sentir compreendida nas delicadezas. Nos pequenos gestos. Nos detalhes. Outro dia ela voltou de viagem com três presentes. Ela sabe exatamente o que me encanta. Duas girafas e uma zebra que estão em perfeita harmonia aqui na minha pequena sala. É como se tivesse um pouco dela no ar, e mais aconchego. Outro dia, veio aqui distrair os pensamentos. Os pensamentos que grudam na cabeça da gente. Enquanto eu colocava o vestido preto de renda, ela agachava no chão assim e assado para alcançar o Moacir. Fez fotos desse e desse ângulo. E agora quer um gatinho só pra ela. Mas eu digo, ela sabe, enquanto isso não acontece, ela pode vir aqui sempre e sempre acariciar a barriga do meu gordinho e deixar meus dias mais felizes. Sempre que ela vem é assim. A vida fica um pouco mais feliz.
Não é de hoje que temos algo muito em comum. E é um pouco inexplicável, acho, a sensação de se sentir compreendida nas delicadezas. Nos pequenos gestos. Nos detalhes. Outro dia ela voltou de viagem com três presentes. Ela sabe exatamente o que me encanta. Duas girafas e uma zebra que estão em perfeita harmonia aqui na minha pequena sala. É como se tivesse um pouco dela no ar, e mais aconchego. Outro dia, veio aqui distrair os pensamentos. Os pensamentos que grudam na cabeça da gente. Enquanto eu colocava o vestido preto de renda, ela agachava no chão assim e assado para alcançar o Moacir. Fez fotos desse e desse ângulo. E agora quer um gatinho só pra ela. Mas eu digo, ela sabe, enquanto isso não acontece, ela pode vir aqui sempre e sempre acariciar a barriga do meu gordinho e deixar meus dias mais felizes. Sempre que ela vem é assim. A vida fica um pouco mais feliz.
:: Ritual para começar o dia
(por e-mail)
queridos,
hoje o dia amanheceu chuvoso aqui. mas... temos o nosso dicionário pra trazer alegria. e hoje é dia da letra "F" com várias definições fofas sobre felicidade. eba!
beijos, beijos
F
fácil e difícil - fácil é comer sorvete. difícil é comer espinafre
felicidade - é quando o coração enche e eu fico com vontade de cantar o tempo todo
felicidade - é a gente querer muito uma coisa e aquela coisa ir ficando cada vez mais perto, mais perto, mais perto
felicidade - é virar verdade tudo o que a gente quer
felicidade - é a gente conseguir gostar da gente
felicidade - é poder consertar a vida de todo mundo
felicidade - não é o que a gente sente. é o que as outras pessoas sentem por nós
felicidade - é uma palavra que tem música
felicidade - é o que os meninos ricos dizem que têm. eu vou passar as férias carregando água pra minha mãe, mas vou cantando
feriado - é um dia que passa tão depressa que parece hora
férias - mãe, não me chama pra comer agora porque estou de férias
filho único - não sei como a mamãe tem coragem de bater em mim, seu filho único
flauta doce - não é doce de comer. é doce de tocar
folgado - é um cara que vem pro meu aniversário, sem trazer presente e come e bebe tudo
(por e-mail)
queridos,
hoje o dia amanheceu chuvoso aqui. mas... temos o nosso dicionário pra trazer alegria. e hoje é dia da letra "F" com várias definições fofas sobre felicidade. eba!
beijos, beijos
F
fácil e difícil - fácil é comer sorvete. difícil é comer espinafre
felicidade - é quando o coração enche e eu fico com vontade de cantar o tempo todo
felicidade - é a gente querer muito uma coisa e aquela coisa ir ficando cada vez mais perto, mais perto, mais perto
felicidade - é virar verdade tudo o que a gente quer
felicidade - é a gente conseguir gostar da gente
felicidade - é poder consertar a vida de todo mundo
felicidade - não é o que a gente sente. é o que as outras pessoas sentem por nós
felicidade - é uma palavra que tem música
felicidade - é o que os meninos ricos dizem que têm. eu vou passar as férias carregando água pra minha mãe, mas vou cantando
feriado - é um dia que passa tão depressa que parece hora
férias - mãe, não me chama pra comer agora porque estou de férias
filho único - não sei como a mamãe tem coragem de bater em mim, seu filho único
flauta doce - não é doce de comer. é doce de tocar
folgado - é um cara que vem pro meu aniversário, sem trazer presente e come e bebe tudo
segunda-feira, novembro 29
:: Por e-mail
amados,
hoje é segunda, mas a gente tem nosso dicionário das creonças para animar o dia (e a semana).
beijos, beijos,
a letra "e"
edifício - o que eu mais gostei do apartamento novo que papai comprou foi o elevador
educação - menino educado é o que não mexe em nada, não fala nada, só diz "obrigado" e "com licença". e, quando a gente quer brincar com ele, ele guarda os brinquedos para não estragar
educação - se mamãe, em vez de ter outro filho, desse educação pra mim e pro meu irmão, a gente não era burro nem mal educado
educação sexual - eu sei como é educação sexual. só que achava a história da cegonha muito mais bonita
elétrons - são os micróbios da eletricidade
escola - é um lugar muito bom. hoje eu até aprendi que gato não é só gato. é felino. só não entendi porque ela foi mudar o nome do gato
escuro - quando acende a luz, pra onde é que vai o escuro?
esperança - é a gente não desistir de esperar
espero - é ser inteligente, mas um inteligente folgado
estetoscópio - é um ouvidor de coração
amados,
hoje é segunda, mas a gente tem nosso dicionário das creonças para animar o dia (e a semana).
beijos, beijos,
a letra "e"
edifício - o que eu mais gostei do apartamento novo que papai comprou foi o elevador
educação - menino educado é o que não mexe em nada, não fala nada, só diz "obrigado" e "com licença". e, quando a gente quer brincar com ele, ele guarda os brinquedos para não estragar
educação - se mamãe, em vez de ter outro filho, desse educação pra mim e pro meu irmão, a gente não era burro nem mal educado
educação sexual - eu sei como é educação sexual. só que achava a história da cegonha muito mais bonita
elétrons - são os micróbios da eletricidade
escola - é um lugar muito bom. hoje eu até aprendi que gato não é só gato. é felino. só não entendi porque ela foi mudar o nome do gato
escuro - quando acende a luz, pra onde é que vai o escuro?
esperança - é a gente não desistir de esperar
espero - é ser inteligente, mas um inteligente folgado
estetoscópio - é um ouvidor de coração
domingo, novembro 28
:: As letras "c" e "d"
As definições prediletas _e devidamente grifadas_ das letras "c" e "d", do "Dicionário de Humor Infantil" de Pedro Bloch (um livro que me dá pequenos momentos de muita alegria).
C
cerimônia - é a gente ser bem educado. quando a tia me disse "não faça cerimônia", eu não fiz. comi os doces todos
céu - para morar no céu não é preciso morrer. é só virar o mundo de cabeça para baixo
chocolate - é uma coisa que a gente nunca oferece aos amigos porque eles aceitam
choro - não tô chorando, não. Tou só lavando os olhos
choro - é chuva dos olhos
ciúme - é quando uma pessoa gosta tanto tanto da outra que fica com medo de dividir
ciúme - é o que a gente sente quando nasce a irmãzinha da gente. a gente gosta tanto dela que era melhor que nem nascesse
cobra - é um bicho que só tem rabo
coceira - é dor de pulga
colher - é um objeto que serve pra gente comer, mas eu devia usar garfo. só que, se eu usar garfo, a comida cai toda no chão do prato
complicação - é coisa que adulto adora. sempre faz uma coisa fácil parecer difícil. eu, por exemplo, descobri que esporadicamente não quer dizer nada de mais só quer dizer de vez em quando
crescer - é uma coisa que dói
D
dia - hoje é amanhã de ontem?
dieta - não gosto de mamãe fazendo dieta. fica pouca mãe pra gostar de mim
distância - a europa fica mais longe que a lua. a lua eu vejo.
As definições prediletas _e devidamente grifadas_ das letras "c" e "d", do "Dicionário de Humor Infantil" de Pedro Bloch (um livro que me dá pequenos momentos de muita alegria).
C
cerimônia - é a gente ser bem educado. quando a tia me disse "não faça cerimônia", eu não fiz. comi os doces todos
céu - para morar no céu não é preciso morrer. é só virar o mundo de cabeça para baixo
chocolate - é uma coisa que a gente nunca oferece aos amigos porque eles aceitam
choro - não tô chorando, não. Tou só lavando os olhos
choro - é chuva dos olhos
ciúme - é quando uma pessoa gosta tanto tanto da outra que fica com medo de dividir
ciúme - é o que a gente sente quando nasce a irmãzinha da gente. a gente gosta tanto dela que era melhor que nem nascesse
cobra - é um bicho que só tem rabo
coceira - é dor de pulga
colher - é um objeto que serve pra gente comer, mas eu devia usar garfo. só que, se eu usar garfo, a comida cai toda no chão do prato
complicação - é coisa que adulto adora. sempre faz uma coisa fácil parecer difícil. eu, por exemplo, descobri que esporadicamente não quer dizer nada de mais só quer dizer de vez em quando
crescer - é uma coisa que dói
D
dia - hoje é amanhã de ontem?
dieta - não gosto de mamãe fazendo dieta. fica pouca mãe pra gostar de mim
distância - a europa fica mais longe que a lua. a lua eu vejo.
sábado, novembro 27
:: Tarde de sol
Primeiro, o sol. Depois, o banho. Em seguida, a cozinha, a faca afiada e uma melancia quase inteira, bem rosa, quase avermelhada. Pico em cubinhos para colocar na geladeira e comer mais tarde. Enquanto isso, Moacir, que adora água gelada, brinca com uma pedrinha de gelo que dei pra ele na varanda, ao lado do pé de café. No som: "Milan", de Matthew Herbert. Tudo se encaixa: 2010 está a-ca-ban-do!
Primeiro, o sol. Depois, o banho. Em seguida, a cozinha, a faca afiada e uma melancia quase inteira, bem rosa, quase avermelhada. Pico em cubinhos para colocar na geladeira e comer mais tarde. Enquanto isso, Moacir, que adora água gelada, brinca com uma pedrinha de gelo que dei pra ele na varanda, ao lado do pé de café. No som: "Milan", de Matthew Herbert. Tudo se encaixa: 2010 está a-ca-ban-do!
sexta-feira, novembro 26
:: A letra "B"
As definições prediletas da letra "b", do "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch.
beleza - a coisa mais linda do mundo é um jardim, quando as flores estão contentes
borboleta - é uma flor que pensa que sabe voar
brincar - a coisa mais alegre do mundo é brincar de pensar pensamento bom
brinquedo - que não deixa a gente pensar que ele pode ser outra coisa, não é brinquedo. por isso é que eu gosto mais de vassoura, que pode ser cavalo, pode ser espada de mocinho e ser, até, cabo de vassoura mesmo
bússola - é um aparelho que toda criança devia ter pra saber onde está. é que eu me perdo muito
As definições prediletas da letra "b", do "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch.
beleza - a coisa mais linda do mundo é um jardim, quando as flores estão contentes
borboleta - é uma flor que pensa que sabe voar
brincar - a coisa mais alegre do mundo é brincar de pensar pensamento bom
brinquedo - que não deixa a gente pensar que ele pode ser outra coisa, não é brinquedo. por isso é que eu gosto mais de vassoura, que pode ser cavalo, pode ser espada de mocinho e ser, até, cabo de vassoura mesmo
bússola - é um aparelho que toda criança devia ter pra saber onde está. é que eu me perdo muito
quinta-feira, novembro 25
:: Troca-troca
Hoje pela manhã, escolhi pessoas que gosto muito para mandar um e-mail com as melhores frases das crianças. Estou louca (lou-ca) com o dicionário do Pedro Bloch. Aí ela me respondeu com a música do Arnaldo Antunes, do Palavra Cantada. Olha que coisa linda:
Cultura
O girino é o peixinho do sapo
O silêncio é o começo do papo
O bigode é a antena do gato
O cavalo é o pasto do carrapato
O cabrito é o cordeiro da cabra
O pescoço é a barriga da cobra
O leitão é um porquinho mais novo
A galinha é um pouquinho do ovo
O desejo é o começo do corpo
Engordar é tarefa do porco
A cegonha é a girafa do ganso
O cachorro é um lobo mais manso
O escuro é a metade da zebra
As raízes são as veias da seiva
O camelo é um cavalo sem sede
Tartaruga por dentro é parede
O potrinho é o bezerro da égua
A batalha é o começo da trégua
Papagaio é um dragão miniatura
Bactéria num meio é cultura
Hoje pela manhã, escolhi pessoas que gosto muito para mandar um e-mail com as melhores frases das crianças. Estou louca (lou-ca) com o dicionário do Pedro Bloch. Aí ela me respondeu com a música do Arnaldo Antunes, do Palavra Cantada. Olha que coisa linda:
Cultura
O girino é o peixinho do sapo
O silêncio é o começo do papo
O bigode é a antena do gato
O cavalo é o pasto do carrapato
O cabrito é o cordeiro da cabra
O pescoço é a barriga da cobra
O leitão é um porquinho mais novo
A galinha é um pouquinho do ovo
O desejo é o começo do corpo
Engordar é tarefa do porco
A cegonha é a girafa do ganso
O cachorro é um lobo mais manso
O escuro é a metade da zebra
As raízes são as veias da seiva
O camelo é um cavalo sem sede
Tartaruga por dentro é parede
O potrinho é o bezerro da égua
A batalha é o começo da trégua
Papagaio é um dragão miniatura
Bactéria num meio é cultura
:: Dentro da cabeça das crianças
Existe uma coisa tão pura nas ideias das crianças que me espanta. De verdade. Uma coisa que a gente perde pra sempre, mais tarde. E então, outro dia ele me consolou com verbetes do "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch, e funcionou tanto, tanto.
Pedro Bloch é um médico e escritor que seguiu os dias anotando coisinhas que ouvia da boca das crianças aqui e acolá. Compilando o que reuniu de melhor, escreveu o livro, com as definições. Ele me disse pra comprar. Esgotado. Chegou ontem, da Estante Virtual, que sempre me salva.
E então comecei a ler. E é lindo. Tem uma sensibilidade e uma alegria naqueles pensamentos que fiquei com vontade de anotar. Vou registrar aqui alguns verbetes, para reler. Vou começar com meus prediletos da letra "A", olha:
Adulto - é uma pessoa que não entende de chuva, criança ou bala
Alegria - é uma gargalhada pendurada na gente
Alegria - o meu irmão divide tudo comigo: brinquedo, sanduíche, sorvete e, até, a alegria dele
Amar - é pensar no outro mesmo quando a gente nem tá pensando
Amar - é querer tanto, tanto uma pessoa, que parece sorvete
Anestesia - é um remédio que não deixa a dor doer. Pra mim, é a maior invenção do homem, depois do sorvete
Avestruz - é a girafa dos passarinhos
Existe uma coisa tão pura nas ideias das crianças que me espanta. De verdade. Uma coisa que a gente perde pra sempre, mais tarde. E então, outro dia ele me consolou com verbetes do "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch, e funcionou tanto, tanto.
Pedro Bloch é um médico e escritor que seguiu os dias anotando coisinhas que ouvia da boca das crianças aqui e acolá. Compilando o que reuniu de melhor, escreveu o livro, com as definições. Ele me disse pra comprar. Esgotado. Chegou ontem, da Estante Virtual, que sempre me salva.
E então comecei a ler. E é lindo. Tem uma sensibilidade e uma alegria naqueles pensamentos que fiquei com vontade de anotar. Vou registrar aqui alguns verbetes, para reler. Vou começar com meus prediletos da letra "A", olha:
Adulto - é uma pessoa que não entende de chuva, criança ou bala
Alegria - é uma gargalhada pendurada na gente
Alegria - o meu irmão divide tudo comigo: brinquedo, sanduíche, sorvete e, até, a alegria dele
Amar - é pensar no outro mesmo quando a gente nem tá pensando
Amar - é querer tanto, tanto uma pessoa, que parece sorvete
Anestesia - é um remédio que não deixa a dor doer. Pra mim, é a maior invenção do homem, depois do sorvete
Avestruz - é a girafa dos passarinhos
:: Livros e amores
Ele sabe. É meu consultor oficial de livros. Acato todas, todas as dicas que me dá. E ele não erra. Lá no começo dos anos 2000, quando nos conhecemos, ele me mandou pelo correio, "Razão e Sensibilidade", de Jane Austen. Virou um dos meus livros da vida. Mandou com uma carta escrita à mão. Um romantismo que não existe mais.
Antes das minhas férias, tivemos uma longa conversa sobre livros. E eu torcendo para a minha querida Livraria da Vila estar aberta naquele dia de eleição para que eu pudesse fazer minha lista de títulos na mesa do café, sob aquela jaboticabeira de que sempre falo, com um expresso curto _ou meu habitual chá de cidreira.
Li, de uma vez só, dois que ele me indicou. "A Dócil", de Dostoievski, sobre um homem que, olhando para sua mulher morta, num caixão em cima da mesa da sala, que havia acabado de se suicidar, repensa toda a relação dos dois, para tentar entender. Mas não. Além do óbvio, o que mais me atrai é a escolha perfeita das palavras para dizer coisas difíceis de colocar em... palavras.
Depois li "Histórias de Amor", de Bioy Casares, um escritor que ainda preciso aprender a amar. Foi um bom recomeço. São contos lindos, de tanto amor, em cenas tão, tão simples.
Bem, dos indicados, Mamãe leu outro, "A Trégua". Foi presente meu, com dedicatória de uma página inteirinha. E ontem à noite, comecei mais um da lista dele: "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch. Acho que vou começar outros escritos só pra ele.
Ele sabe. É meu consultor oficial de livros. Acato todas, todas as dicas que me dá. E ele não erra. Lá no começo dos anos 2000, quando nos conhecemos, ele me mandou pelo correio, "Razão e Sensibilidade", de Jane Austen. Virou um dos meus livros da vida. Mandou com uma carta escrita à mão. Um romantismo que não existe mais.
Antes das minhas férias, tivemos uma longa conversa sobre livros. E eu torcendo para a minha querida Livraria da Vila estar aberta naquele dia de eleição para que eu pudesse fazer minha lista de títulos na mesa do café, sob aquela jaboticabeira de que sempre falo, com um expresso curto _ou meu habitual chá de cidreira.
Li, de uma vez só, dois que ele me indicou. "A Dócil", de Dostoievski, sobre um homem que, olhando para sua mulher morta, num caixão em cima da mesa da sala, que havia acabado de se suicidar, repensa toda a relação dos dois, para tentar entender. Mas não. Além do óbvio, o que mais me atrai é a escolha perfeita das palavras para dizer coisas difíceis de colocar em... palavras.
Depois li "Histórias de Amor", de Bioy Casares, um escritor que ainda preciso aprender a amar. Foi um bom recomeço. São contos lindos, de tanto amor, em cenas tão, tão simples.
Bem, dos indicados, Mamãe leu outro, "A Trégua". Foi presente meu, com dedicatória de uma página inteirinha. E ontem à noite, comecei mais um da lista dele: "Dicionário de Humor Infantil", de Pedro Bloch. Acho que vou começar outros escritos só pra ele.
quarta-feira, novembro 24
:: O que as pessoas comem
Não é de hoje minha fixação pela comida. Mas é coisa mais recente, de um ano, dois, essa mania louca de grifar em todas as matérias e livros e afins o que as pessoas gostam de comer. Grifar e, mais, anotar num caderno. Coisas como as framboesas silvestres que o Chet Baker colhia, ou o caqui maduro, tirado do pé, que já registrei aqui.
Mas tem também muita coisa pra contar do Louis Armstrong. Depois de tocar nos barcos turísticos que circulavam pelo rio Mississippi e comer loucamente, teve de trocar o guarda-roupas e comprar "calças para gordos". De lá pra 1971, quando morreu, insistiu nos mais variados regimes e tomava um laxante caseiro, feito com ervas colhidas nos trilhos do trem. Tudo para que emagrecesse sem ter de abrir mão de seus feijões-vermelhos com arroz.
Nesta semana, estou especialmente entusiasmada com a leitura da Ilustrada. Entendi facilmente por quê. Textos sobre arte, música, colunas e cia. citam comida. Vê se não dá um toque especial:
"Nunca me esqueço do bife a cavalo que comi, quando desembarquei no Brasil. É uma das minhas comidas preferidas", Tomie Ohtake
"Tudo que quero é praticar. Bach e café todas as manhãs", Brad Mehldau
"Só um espírito grosseiro incluiria os cupcakes na categoria da empadinha ou do bombocado. Pertencem a um mundo em miniatura, o dos carrinhos de colecionador, dos sabonetinhos de hotel, dos anõezinhos de jardim e da Barbie", Marcelo Coelho
Não é de hoje minha fixação pela comida. Mas é coisa mais recente, de um ano, dois, essa mania louca de grifar em todas as matérias e livros e afins o que as pessoas gostam de comer. Grifar e, mais, anotar num caderno. Coisas como as framboesas silvestres que o Chet Baker colhia, ou o caqui maduro, tirado do pé, que já registrei aqui.
Mas tem também muita coisa pra contar do Louis Armstrong. Depois de tocar nos barcos turísticos que circulavam pelo rio Mississippi e comer loucamente, teve de trocar o guarda-roupas e comprar "calças para gordos". De lá pra 1971, quando morreu, insistiu nos mais variados regimes e tomava um laxante caseiro, feito com ervas colhidas nos trilhos do trem. Tudo para que emagrecesse sem ter de abrir mão de seus feijões-vermelhos com arroz.
Nesta semana, estou especialmente entusiasmada com a leitura da Ilustrada. Entendi facilmente por quê. Textos sobre arte, música, colunas e cia. citam comida. Vê se não dá um toque especial:
"Nunca me esqueço do bife a cavalo que comi, quando desembarquei no Brasil. É uma das minhas comidas preferidas", Tomie Ohtake
"Tudo que quero é praticar. Bach e café todas as manhãs", Brad Mehldau
"Só um espírito grosseiro incluiria os cupcakes na categoria da empadinha ou do bombocado. Pertencem a um mundo em miniatura, o dos carrinhos de colecionador, dos sabonetinhos de hotel, dos anõezinhos de jardim e da Barbie", Marcelo Coelho
terça-feira, novembro 23
:: Aos mais experientes
Aqui no jornal tem essa coisa de ter de explicar tudo. Lembro que o fim foi quando eu tive de abrir um parenteses depois de sushi (su-shi) para explicar que diabos era aquela "iguaria tão rara" (rá!). Mas isso já faz tempo. De qualquer maneira, foi a minha escola e hoje tem essa coisa dos parenteses para dar as coordenadas dos termos. Quase sempre. Hoje não queria explicar o que era comim.
- Ivan, preciso explicar o que é comim?
- Comim? Aqueles garçonzinhos?
- É, os auxiliares.
- Não. Quem não souber vai saber depois de ler sua matéria porque vai ver no dicionário ou perguntar pra mãe. Eu sou dessa linha.
E eu fiz um coração gigante pra ele no ar. Rá!
Aqui no jornal tem essa coisa de ter de explicar tudo. Lembro que o fim foi quando eu tive de abrir um parenteses depois de sushi (su-shi) para explicar que diabos era aquela "iguaria tão rara" (rá!). Mas isso já faz tempo. De qualquer maneira, foi a minha escola e hoje tem essa coisa dos parenteses para dar as coordenadas dos termos. Quase sempre. Hoje não queria explicar o que era comim.
- Ivan, preciso explicar o que é comim?
- Comim? Aqueles garçonzinhos?
- É, os auxiliares.
- Não. Quem não souber vai saber depois de ler sua matéria porque vai ver no dicionário ou perguntar pra mãe. Eu sou dessa linha.
E eu fiz um coração gigante pra ele no ar. Rá!
sábado, novembro 20
:: Momentos de alegria e os mínimos detalhes
(na foto, a Má e o Moacir)
Combinamos um jantar rápido na minicasa. Só para a sexta não passar em branco. Na noite anterior, ela tinha dormido só duas, três horas. Eu dormi um pouco mais, mas no dia seguinte ia cair da cama pra cuidar da fila do Paul. Então ficou acertada uma saladinha básica, de folhas verdes, palmito, tomatinhos minúsculos e adocicados e bolinhas de queijo de cabra no azeite. Para temperar, azeite espanhol, aceto balsâmico autêntico (envelhecido em Módena) e sal em cristais, para moer. Uma taça de vinho de branco. Água gelada. Depois, ela tomou um licor, nas minhas minitacinhas de cristal que papai me deu. Eu tomei um chá branco, orgânico, na minha xícara florida de vó. Mas o que a gente mais gostou, além do fato em si de estarmos ali conversando mais uma noite sobre coisas da vida, foi a mesa. Ia ser algo rápido e simples, mas fizemos daquele momento algo fofo, como a gente gosta. Uma saladeira colorida, com talheres coloridos. Pratos brancos, taças de cristal. Os croûtons servidos em minipotinhos trabalhados em cerâmica, em relevos ultradelicados, que ela acabou de me trazer de presente da Turquia. Tudo pensado nos mínimos detalhes. E aquela alegria que dá.
(na foto, a Má e o Moacir)
Combinamos um jantar rápido na minicasa. Só para a sexta não passar em branco. Na noite anterior, ela tinha dormido só duas, três horas. Eu dormi um pouco mais, mas no dia seguinte ia cair da cama pra cuidar da fila do Paul. Então ficou acertada uma saladinha básica, de folhas verdes, palmito, tomatinhos minúsculos e adocicados e bolinhas de queijo de cabra no azeite. Para temperar, azeite espanhol, aceto balsâmico autêntico (envelhecido em Módena) e sal em cristais, para moer. Uma taça de vinho de branco. Água gelada. Depois, ela tomou um licor, nas minhas minitacinhas de cristal que papai me deu. Eu tomei um chá branco, orgânico, na minha xícara florida de vó. Mas o que a gente mais gostou, além do fato em si de estarmos ali conversando mais uma noite sobre coisas da vida, foi a mesa. Ia ser algo rápido e simples, mas fizemos daquele momento algo fofo, como a gente gosta. Uma saladeira colorida, com talheres coloridos. Pratos brancos, taças de cristal. Os croûtons servidos em minipotinhos trabalhados em cerâmica, em relevos ultradelicados, que ela acabou de me trazer de presente da Turquia. Tudo pensado nos mínimos detalhes. E aquela alegria que dá.
:: Rápidas e inúteis
1.
- E seu inglês tá tão bom assim?
- Eu falo com ele com cinco janelas de dicionário abertas
2.
"Toda trabalhada na vingança"
3.
"Ainda bem que tá verão. Adoro o verão", disse olhando para a maior nuvem preta dos últimos dias, com casaco no joelho e botas de chuva.
4.
- Tô muito maquiada? Porque tava um trânsito terrível e eu não tinha nada pra fazer...
5.
Duas amigas e um amigo:
- Nossa, seu cabelo está lindo, diz o amigo para a amiga 1
- E o meu? pergunta a amiga 2
- O seu está como sempre, diz o amigo e fica quieto. Como sempre li-ndo.
6.
"Toda trabalhada no roxo"
7.
"Como diz minha mãe, não deixe ninguém fazer festinha na sua cabeça"
1.
- E seu inglês tá tão bom assim?
- Eu falo com ele com cinco janelas de dicionário abertas
2.
"Toda trabalhada na vingança"
3.
"Ainda bem que tá verão. Adoro o verão", disse olhando para a maior nuvem preta dos últimos dias, com casaco no joelho e botas de chuva.
4.
- Tô muito maquiada? Porque tava um trânsito terrível e eu não tinha nada pra fazer...
5.
Duas amigas e um amigo:
- Nossa, seu cabelo está lindo, diz o amigo para a amiga 1
- E o meu? pergunta a amiga 2
- O seu está como sempre, diz o amigo e fica quieto. Como sempre li-ndo.
6.
"Toda trabalhada no roxo"
7.
"Como diz minha mãe, não deixe ninguém fazer festinha na sua cabeça"
:: Embalo
Ouvindo Beatles ("Rubber Soul", um dos meus prediletos) desde às 7h da manhã, durante o banho e o café da manhã, para entrar no clima da megacobertura que faremos dos shows de Paul McCartney que, atenção, nasceu no mesmo dia que eu, anos e anos antes. Feliz da vida indo pra fila, neste sábado de sol, conversar loucamente com os fãs que estão acampados lá há um, dois dias. Computador, celular e todo kit do jornal para mandar as matérias da rua. Ela disse que "sou uma repórter" e eu adoro a sensação de sair da patota da gastronomia vez ou outra. É algo que tem a ver com liberdade.
Ouvindo Beatles ("Rubber Soul", um dos meus prediletos) desde às 7h da manhã, durante o banho e o café da manhã, para entrar no clima da megacobertura que faremos dos shows de Paul McCartney que, atenção, nasceu no mesmo dia que eu, anos e anos antes. Feliz da vida indo pra fila, neste sábado de sol, conversar loucamente com os fãs que estão acampados lá há um, dois dias. Computador, celular e todo kit do jornal para mandar as matérias da rua. Ela disse que "sou uma repórter" e eu adoro a sensação de sair da patota da gastronomia vez ou outra. É algo que tem a ver com liberdade.
quinta-feira, novembro 18
:: Uma manhã
Nesta manhã, tive um despertar precoce, com o nascer do dia. Fiquei algumas horas ao sol, enquanto lia o jornal e aquelas páginas especiais sobre o Paul McCartney e a reportagem de capa da Ilustrada, sobre o show do Ornette Colemam. Eu lia, ria alto e agradecia aos céus por não ter caído no meu colo. Pedi pra cuidar dessa matéria, em pessoa, de joelhos, mas minhas férias estragaram o cronograma. Ufa! Imagine o que ia causar em mim uma entrevista que fez um repórter desse duvidar de seu próprio inglês ou de sua engenhosidade para conduzir a conversa.
Antes e depois do sol um copo d'água gelada. Bem gelada. Banho lento. Cremes pós-banho para os pés, para o cabelo, para o rosto, para o corpo. Ao som de Noites Cariocas, com uma alegria estranha. Estranha para o segundo dia de trabalho, depois das férias. Sandália amarela, bolsa amarela, regata branca e, senti, enfim, que 2010 está acabando. Dentro e fora de mim.
Nesta manhã, tive um despertar precoce, com o nascer do dia. Fiquei algumas horas ao sol, enquanto lia o jornal e aquelas páginas especiais sobre o Paul McCartney e a reportagem de capa da Ilustrada, sobre o show do Ornette Colemam. Eu lia, ria alto e agradecia aos céus por não ter caído no meu colo. Pedi pra cuidar dessa matéria, em pessoa, de joelhos, mas minhas férias estragaram o cronograma. Ufa! Imagine o que ia causar em mim uma entrevista que fez um repórter desse duvidar de seu próprio inglês ou de sua engenhosidade para conduzir a conversa.
Antes e depois do sol um copo d'água gelada. Bem gelada. Banho lento. Cremes pós-banho para os pés, para o cabelo, para o rosto, para o corpo. Ao som de Noites Cariocas, com uma alegria estranha. Estranha para o segundo dia de trabalho, depois das férias. Sandália amarela, bolsa amarela, regata branca e, senti, enfim, que 2010 está acabando. Dentro e fora de mim.
quarta-feira, novembro 17
:: Romantismo para mulheres
Outro dia ele me sondou. Me perguntou sobre flores. Conversamos um tanto, cada um com sua caneca de café com leite na mão, bebendo pequenos goles, lentamente. Hoje, no meio da tarde, recebi uma ligação da portaria do jornal. Flores. Desci certa de que eram flores de assessoria, como costuma ser. Mas não. Era dele. Uma rosa vermelha. No envelope vinha um cartão branco com poucas palavras. Letras muito bem desenhadas diziam, juntas, para que eu tivesse "uma volta ao trabalho mais feliz". Ele sabe o quanto funcionou. Ainda não falei muito bem, mas imagino que ele saiba. Porque ele sabe bem mais sobre mim. Sabe que sou friorenta e me empresta o casaco para molhar na chuva. Sabe que sou romântica e adoro esses pequenos gestos de delicadeza.
Outro dia ele me sondou. Me perguntou sobre flores. Conversamos um tanto, cada um com sua caneca de café com leite na mão, bebendo pequenos goles, lentamente. Hoje, no meio da tarde, recebi uma ligação da portaria do jornal. Flores. Desci certa de que eram flores de assessoria, como costuma ser. Mas não. Era dele. Uma rosa vermelha. No envelope vinha um cartão branco com poucas palavras. Letras muito bem desenhadas diziam, juntas, para que eu tivesse "uma volta ao trabalho mais feliz". Ele sabe o quanto funcionou. Ainda não falei muito bem, mas imagino que ele saiba. Porque ele sabe bem mais sobre mim. Sabe que sou friorenta e me empresta o casaco para molhar na chuva. Sabe que sou romântica e adoro esses pequenos gestos de delicadeza.
:: O prédio
E então, enquanto espero o elevador, adoro ficar plantada na frente do painel de comunicados para ler aqueles trecos que a síndica escreve. Hoje deu até alegria. Um comunicado enorme lembrava as regras do condomínio, que proíbe passear com os "animais de estimação nas dependências comuns do prédio". Bem, além de retomar as normas e esclarecer que alguns condôminos têm infringido (é assim, infringido?) a "lei", registra que para piorar "alguns animais têm realizado suas necessidades fisiológicas nas dependências do condomínio". De novo: "alguns animais têm realizado suas necessidades fisiológicas nas dependências do condomínio". Bom, vai?
E então, enquanto espero o elevador, adoro ficar plantada na frente do painel de comunicados para ler aqueles trecos que a síndica escreve. Hoje deu até alegria. Um comunicado enorme lembrava as regras do condomínio, que proíbe passear com os "animais de estimação nas dependências comuns do prédio". Bem, além de retomar as normas e esclarecer que alguns condôminos têm infringido (é assim, infringido?) a "lei", registra que para piorar "alguns animais têm realizado suas necessidades fisiológicas nas dependências do condomínio". De novo: "alguns animais têm realizado suas necessidades fisiológicas nas dependências do condomínio". Bom, vai?
terça-feira, novembro 16
domingo, novembro 14
:: Coisas que não passam
Acho que até ontem, ou anteontem, não me lembro bem, ela não devia saber exatamente a gravidade do problema. Também, cá comigo, acho que nunca quis colocar a gravidade pra fora de mim. Talvez, nem pra dentro. Mas a verdade é que ela é uma amiga que não passa. E não vai passar. A gente sabe.
Na minha ausência, que coisa, deixei de visitá-la no hospital, depois que o filhotinho caçaula nasceu. Deixei de ir ao aniversário da filhotinha mais velha, com quem convivi tanto em Paris. Deixei, até, de ir ao aniversário dela própria. E nem sequer liguei para dar os parabéns.
Mas outro dia finalmente nos vimos. Sentamos no sofá, falamos da casa nova, dos filhos (novos e antigos), do gato, das crises, de cosméticos e livros. Depois de um bom tempo, ela voltou a ler. Eu também. Ela lê enquanto amamenta madrugada adentro. Eu leio em todas as outras horas. Ela contou que leu cinco livros nos últimos três meses. Eu disse que, no último mês, li três e dois meios.
E então contei das anotações de Leonardo da Vinci em seus "Cadernos de Cozinha". E prometi um texto. Um texto escrito só pra ela. Um texto contando as partes mais engraçadas do livro, que ela acha que é piada, mas não é. Depois, qualquer dia em que eu estiver mais inspirada, vale outros escritos sobre as passagens mais interessantes, como a fazenda em que ele morava quando pequeno, o costume de misturar água e vinho para purificar a água contaminada e por aí vai.
Mas agora, eu disse, vou reservar para ela as passagens que me fizeram rir. Como aquela cena do pepino. A fulana de tal acabou morta na fogueira por "mau uso do pepino". Tem também aquela dica de limpar as teias de aranha que se formam nos repolhos porque podem causar vômitos e "até uma paralisia completa".
Ele ensina ainda a matar um pavão (como uma cabra!) e depois, para amaciá-lo é preciso pendurá-lo com a cabeça para baixo em uma fi-guei-ra. Precisa ser uma figueira, atenção. A parte mais chocante, que me fez rolar de rir, no entanto, foi o capítulo dedicado aos "procedimentos indecorosos à mesa", como uma espécie de "manual de boas maneiras".
Presta atenção:
- Não porá pedaços mastigados de sua própria comida no prato de seu vizinho sem primeiro perguntar a ele.
- Não limpará a faca na roupa de seu vizinho.
- Não cortará a mesa com a faca.
- Não baterá nos serviçais (só pode fazê-lo em caso de sua própria defesa).
Ele ainda ensina como dispor um assassino à mesa, fala sobre sua invenção dos guardanapos, para substituir os coelhos que eram colocados ao pé de cada cadeira para que os convidados limpassem a gordura das mãos durante a refeição, lembra de alguns males que a comida pode causar, como comer muita ervilha, que pode levar o sujeito à loucura.
Acho que até ontem, ou anteontem, não me lembro bem, ela não devia saber exatamente a gravidade do problema. Também, cá comigo, acho que nunca quis colocar a gravidade pra fora de mim. Talvez, nem pra dentro. Mas a verdade é que ela é uma amiga que não passa. E não vai passar. A gente sabe.
Na minha ausência, que coisa, deixei de visitá-la no hospital, depois que o filhotinho caçaula nasceu. Deixei de ir ao aniversário da filhotinha mais velha, com quem convivi tanto em Paris. Deixei, até, de ir ao aniversário dela própria. E nem sequer liguei para dar os parabéns.
Mas outro dia finalmente nos vimos. Sentamos no sofá, falamos da casa nova, dos filhos (novos e antigos), do gato, das crises, de cosméticos e livros. Depois de um bom tempo, ela voltou a ler. Eu também. Ela lê enquanto amamenta madrugada adentro. Eu leio em todas as outras horas. Ela contou que leu cinco livros nos últimos três meses. Eu disse que, no último mês, li três e dois meios.
E então contei das anotações de Leonardo da Vinci em seus "Cadernos de Cozinha". E prometi um texto. Um texto escrito só pra ela. Um texto contando as partes mais engraçadas do livro, que ela acha que é piada, mas não é. Depois, qualquer dia em que eu estiver mais inspirada, vale outros escritos sobre as passagens mais interessantes, como a fazenda em que ele morava quando pequeno, o costume de misturar água e vinho para purificar a água contaminada e por aí vai.
Mas agora, eu disse, vou reservar para ela as passagens que me fizeram rir. Como aquela cena do pepino. A fulana de tal acabou morta na fogueira por "mau uso do pepino". Tem também aquela dica de limpar as teias de aranha que se formam nos repolhos porque podem causar vômitos e "até uma paralisia completa".
Ele ensina ainda a matar um pavão (como uma cabra!) e depois, para amaciá-lo é preciso pendurá-lo com a cabeça para baixo em uma fi-guei-ra. Precisa ser uma figueira, atenção. A parte mais chocante, que me fez rolar de rir, no entanto, foi o capítulo dedicado aos "procedimentos indecorosos à mesa", como uma espécie de "manual de boas maneiras".
Presta atenção:
- Não porá pedaços mastigados de sua própria comida no prato de seu vizinho sem primeiro perguntar a ele.
- Não limpará a faca na roupa de seu vizinho.
- Não cortará a mesa com a faca.
- Não baterá nos serviçais (só pode fazê-lo em caso de sua própria defesa).
Ele ainda ensina como dispor um assassino à mesa, fala sobre sua invenção dos guardanapos, para substituir os coelhos que eram colocados ao pé de cada cadeira para que os convidados limpassem a gordura das mãos durante a refeição, lembra de alguns males que a comida pode causar, como comer muita ervilha, que pode levar o sujeito à loucura.
:: O gato
Atualmente, a principal diversão do Moacir é jogar meus cotonetes (muito bem organizados num potinho verde próprio pra isso) no chão. Depois, ele espalha todos, freneticamente, e brinca, brinca. Como se estivesse tudo ótimo. Eu, besta, sou incapaz de ensinar a ele que isso é errado. Ele fica numa alegria tão verdadeira que não dá vontade de fazer acabar.
Atualmente, a principal diversão do Moacir é jogar meus cotonetes (muito bem organizados num potinho verde próprio pra isso) no chão. Depois, ele espalha todos, freneticamente, e brinca, brinca. Como se estivesse tudo ótimo. Eu, besta, sou incapaz de ensinar a ele que isso é errado. Ele fica numa alegria tão verdadeira que não dá vontade de fazer acabar.
sábado, novembro 13
quinta-feira, novembro 11
:: O mundo paralelo dos gordos
No meio da pilha de livros que levamos pra praia, estava "Diário de um Magro", do Mario Prata. Ela que trouxe. Eu fui de coisas de outra natureza. Depois conto. Mas então a gente criou uma mania de ler trechos em voz alta, quando valia. Às vezes eu, às vezes ela. Foi assim:
"Todo gordo é engraçado"
"A gorda emagreceu e perdeu todos os amigos"
Enquanto isso, eu lia loucamete as histórias de suicídio, do Dostoiévski, para equilibrar os humores.
No meio da pilha de livros que levamos pra praia, estava "Diário de um Magro", do Mario Prata. Ela que trouxe. Eu fui de coisas de outra natureza. Depois conto. Mas então a gente criou uma mania de ler trechos em voz alta, quando valia. Às vezes eu, às vezes ela. Foi assim:
"Todo gordo é engraçado"
"A gorda emagreceu e perdeu todos os amigos"
Enquanto isso, eu lia loucamete as histórias de suicídio, do Dostoiévski, para equilibrar os humores.
:: Tres tres chic
Um amigo meu diz que "ser jornalista é a forma mais chique de ser pobre". Verdade. Mas ser sobrinha do meu tio arquiteto também funciona: agora tenho um box de vidrotil branco, por exemplo. Do dia para a noite. Ser filha do meu pai idem: ganho guardanapos coloridos para toalhas e louças brancas e acessórios de cozinha da Escandinávia, berço dos belíssimos designs. Só isso. Num dia qualquer, assim, numa quarta-feira de chuva à noite...
Um amigo meu diz que "ser jornalista é a forma mais chique de ser pobre". Verdade. Mas ser sobrinha do meu tio arquiteto também funciona: agora tenho um box de vidrotil branco, por exemplo. Do dia para a noite. Ser filha do meu pai idem: ganho guardanapos coloridos para toalhas e louças brancas e acessórios de cozinha da Escandinávia, berço dos belíssimos designs. Só isso. Num dia qualquer, assim, numa quarta-feira de chuva à noite...
domingo, novembro 7
sábado, novembro 6
:: Meninices
Da estrada fui direto para a manicure fazer pés, mãos, depilação. Serviço completo. Comprei, numa passada pela farmácia, um novo hidratante e escovas de dentes para estocar. Tenho disso. Refiz o kit sol também, com protetores assim e assado. Depois, adivinha? Comprei a meia arrastão que ela me obrigou, lá da Turquia. Se achar ruim, ela escreveu em uma mensagem de texto por celular, você coloca uma meia mais clara por baixo. Mais tarde, ouvi uma ou duas vezes a música do Quincy Jones que a Amy gravou e ele mandou de presente, por e-mail. Agora estou me arrumando praquela festinha, com lápis de olho, salto alto e perfume.
Da estrada fui direto para a manicure fazer pés, mãos, depilação. Serviço completo. Comprei, numa passada pela farmácia, um novo hidratante e escovas de dentes para estocar. Tenho disso. Refiz o kit sol também, com protetores assim e assado. Depois, adivinha? Comprei a meia arrastão que ela me obrigou, lá da Turquia. Se achar ruim, ela escreveu em uma mensagem de texto por celular, você coloca uma meia mais clara por baixo. Mais tarde, ouvi uma ou duas vezes a música do Quincy Jones que a Amy gravou e ele mandou de presente, por e-mail. Agora estou me arrumando praquela festinha, com lápis de olho, salto alto e perfume.
domingo, outubro 31
:: Caderno de notas
Não é de hoje que ele me diz "descanse bem" e eu acho lindo. Já anotei uma, duas, três vezes. Vez ou outra eu fuço meus cadernos de antigamente e acho ali registrada essa ideia de "descansar bem". Outras tantas vezes ele me diz de novo. Antes de dormir ou antes de alguma viagem. Depende.
Não é de hoje que ele me diz "descanse bem" e eu acho lindo. Já anotei uma, duas, três vezes. Vez ou outra eu fuço meus cadernos de antigamente e acho ali registrada essa ideia de "descansar bem". Outras tantas vezes ele me diz de novo. Antes de dormir ou antes de alguma viagem. Depende.
sábado, outubro 30
segunda-feira, outubro 25
:: Registros inúteis
Ela deu para fazer aula de balé agora, depois de velha, beirando os 30. E então, pela manhã, a gente fica esparramada na cama conversando por uma ou duas horas, antes do café da manhã, que, aliás, a gente tem pulado sempre aqui no Rio. Ela fica de barriga para cima, com os pés erguidos, abrindo os dedos o quanto pode, os metatarsos, diz. As falanges, corrige. Isso tudo porque outro dia ela insistiu em fazer uma ponta e quase quebrou o tornozelo.
Ela deu para fazer aula de balé agora, depois de velha, beirando os 30. E então, pela manhã, a gente fica esparramada na cama conversando por uma ou duas horas, antes do café da manhã, que, aliás, a gente tem pulado sempre aqui no Rio. Ela fica de barriga para cima, com os pés erguidos, abrindo os dedos o quanto pode, os metatarsos, diz. As falanges, corrige. Isso tudo porque outro dia ela insistiu em fazer uma ponta e quase quebrou o tornozelo.
sábado, outubro 23
:: Do outro lado
Ela habilitou o celular para receber e enviar mensagens de onde quer que fosse. Ufa. Por isso vez ou outra ela escreve lá da Turquia com notícias fresquinhas, daquele exato momento. E então parece que meu coração dá uma leve acalmada e até respiro melhor. Escreve contando que está "sentada numa vilinha linda", onde pediu um "rosé com queijo feta", depois me chama pra ir pra lá. Quem dera. Outro dia disse que eu ia ficar orgulhosa dela: fez amizade com gatos na rua. Vários. E eu fiquei mesmo. Dia desses ela resolveu mandar um e-mail, com mais detalhes. Me contou do dia de chuva e preguiça e me mandou um trechinho do livro do Garcia Marquez que está lendo por lá, o último que ela tem em português. Assim, olha: "Não há remédio que cure o que a felicidade não cura". Eu adorei, ela sabe.
Ela habilitou o celular para receber e enviar mensagens de onde quer que fosse. Ufa. Por isso vez ou outra ela escreve lá da Turquia com notícias fresquinhas, daquele exato momento. E então parece que meu coração dá uma leve acalmada e até respiro melhor. Escreve contando que está "sentada numa vilinha linda", onde pediu um "rosé com queijo feta", depois me chama pra ir pra lá. Quem dera. Outro dia disse que eu ia ficar orgulhosa dela: fez amizade com gatos na rua. Vários. E eu fiquei mesmo. Dia desses ela resolveu mandar um e-mail, com mais detalhes. Me contou do dia de chuva e preguiça e me mandou um trechinho do livro do Garcia Marquez que está lendo por lá, o último que ela tem em português. Assim, olha: "Não há remédio que cure o que a felicidade não cura". Eu adorei, ela sabe.
sexta-feira, outubro 22
:: O desconhecido e as homenagens
Entendo que minha mãe, meu pai, minha irmã me liguem todas às quintas bem cedinho, depois de ler minhas matérias. Entendo que eles nunca falham. Entendo também que minhas amigas de infância venham aqui me ler um pouco, de tempos em tempos. Entendo até que as mães dessas amigas, com as quais cresci, escrevam para elas falando de uma matéria ou outra que saiu no jornal com meu nome e elas gostaram. Muito. Orgulhosas.
O que ainda não entendo direito é que, às vezes, aparece um ou outro por aqui e para. Um ou outro que não me conhece. E volta. Faz pouco tempo que ela apareceu para deixar um recadinho delicado, que nem respondi. Tenho essa mania terrível de, primeiro, paralisar, e depois ler e reler e achar lindo. Verdade.
Disse "a maneira que você escreve é perfeita" e que consigo atingir quem eu nem conheço. Não respondi, mas fiquei intrigada com essa coisa. E outras também. Como essa coisa dela compartilhar meus "pequenos prazeres".
Uns dias antes, ele apareceu. Ficou intrigado com alguma coisa naquela cena da manteiga president, do jornal esparramado sobre a mesa, dos pães frescos. Com ela foi diferente. Ela ficou inquieta com a coincidência de um recado que publiquei, dizendo que minha amiga adorava ler a Ilustrada às quintas por dois motivos. Eu e Contardo. Escreveu dizendo o mesmo.
Depois trocamos um, dois e-mails. Mas fiquei com esse texto aqui parado. Desde lá. Há um tanto de tempo. Lembrei dela principalmente no fim de semana passado, por conta dos shows da caixa preta, em homenagem ao Itamar. O Itamar, aquele poeta, aquele cantor, que ganhou um radinho de pilha ainda pequeno e ia dar nome ao meu gato.
Quando me escreveu, contou que ia assistir a todos. Eu pensei o mesmo. Mas, quando chegou a hora, acabei não indo. Não nos primeiros. Tive certa vontade de escrever perguntando como foi. E contar algumas histórias do Itamar, que não sei se ela sabe, mas são as minhas prediletas. Tenho disso. Dessa coisa de reunir histórias prediletas para contar.
Entendo que minha mãe, meu pai, minha irmã me liguem todas às quintas bem cedinho, depois de ler minhas matérias. Entendo que eles nunca falham. Entendo também que minhas amigas de infância venham aqui me ler um pouco, de tempos em tempos. Entendo até que as mães dessas amigas, com as quais cresci, escrevam para elas falando de uma matéria ou outra que saiu no jornal com meu nome e elas gostaram. Muito. Orgulhosas.
O que ainda não entendo direito é que, às vezes, aparece um ou outro por aqui e para. Um ou outro que não me conhece. E volta. Faz pouco tempo que ela apareceu para deixar um recadinho delicado, que nem respondi. Tenho essa mania terrível de, primeiro, paralisar, e depois ler e reler e achar lindo. Verdade.
Disse "a maneira que você escreve é perfeita" e que consigo atingir quem eu nem conheço. Não respondi, mas fiquei intrigada com essa coisa. E outras também. Como essa coisa dela compartilhar meus "pequenos prazeres".
Uns dias antes, ele apareceu. Ficou intrigado com alguma coisa naquela cena da manteiga president, do jornal esparramado sobre a mesa, dos pães frescos. Com ela foi diferente. Ela ficou inquieta com a coincidência de um recado que publiquei, dizendo que minha amiga adorava ler a Ilustrada às quintas por dois motivos. Eu e Contardo. Escreveu dizendo o mesmo.
Depois trocamos um, dois e-mails. Mas fiquei com esse texto aqui parado. Desde lá. Há um tanto de tempo. Lembrei dela principalmente no fim de semana passado, por conta dos shows da caixa preta, em homenagem ao Itamar. O Itamar, aquele poeta, aquele cantor, que ganhou um radinho de pilha ainda pequeno e ia dar nome ao meu gato.
Quando me escreveu, contou que ia assistir a todos. Eu pensei o mesmo. Mas, quando chegou a hora, acabei não indo. Não nos primeiros. Tive certa vontade de escrever perguntando como foi. E contar algumas histórias do Itamar, que não sei se ela sabe, mas são as minhas prediletas. Tenho disso. Dessa coisa de reunir histórias prediletas para contar.
:: Fofurinhas
Ele tinha reparado que eu estava mesmo cansada. Mais: cansada e triste, bem triste. Então ficamos naquele quarto de hospital, já tarde da noite, e ele cantou pra mim. Antes me perguntou se eu conhecia a música "Luiza". Não a do Tom Jobim que a gente tanto conhece. A do Toquinho e do Chico. E eu sorri. Não conhecia. Então ele cantarolou, bem baixinho. E, no final, é assim:
"É por ela que espanto de casa
As sombras da rua
Faço a lua
Faço a brisa
Pra Luiza dormir em paz"
Ele tinha reparado que eu estava mesmo cansada. Mais: cansada e triste, bem triste. Então ficamos naquele quarto de hospital, já tarde da noite, e ele cantou pra mim. Antes me perguntou se eu conhecia a música "Luiza". Não a do Tom Jobim que a gente tanto conhece. A do Toquinho e do Chico. E eu sorri. Não conhecia. Então ele cantarolou, bem baixinho. E, no final, é assim:
"É por ela que espanto de casa
As sombras da rua
Faço a lua
Faço a brisa
Pra Luiza dormir em paz"
quinta-feira, outubro 21
quinta-feira, outubro 14
:: Uma manhã
Quando a gente engasga de choro, normalmente a gente merece uma manhã de pequenas alegrias. Um tanto de sol, unhas feitas, de vermelho, um pouco de frio, um pouco de flores. Foi assim nesta manhã. Comprei flores brancas, frésias. Organizei um vaso maior, que ficou feio. Outros quatro pequenininhos, fofos. E agora tem certa alegria na minicasa. E um perfume diferente do habitual.
Quando a gente engasga de choro, normalmente a gente merece uma manhã de pequenas alegrias. Um tanto de sol, unhas feitas, de vermelho, um pouco de frio, um pouco de flores. Foi assim nesta manhã. Comprei flores brancas, frésias. Organizei um vaso maior, que ficou feio. Outros quatro pequenininhos, fofos. E agora tem certa alegria na minicasa. E um perfume diferente do habitual.
quarta-feira, outubro 13
:: Trechos românticos
E então eu estava lendo um bocado de coisas sobre cerveja e achei, no livro editado por Michael Jackson, uma passagem cheia de romantismo. Olha: Na cerveja acrescentava-se uma mistura de ervas, tícpica da produção inglesa. "Incluía normalmente plantas do pântano como murta do brejo e alecrim silvestre".
"Plantas do pântano como murta do brejo e alecrim silvestre". Não é ou não é?
E então eu estava lendo um bocado de coisas sobre cerveja e achei, no livro editado por Michael Jackson, uma passagem cheia de romantismo. Olha: Na cerveja acrescentava-se uma mistura de ervas, tícpica da produção inglesa. "Incluía normalmente plantas do pântano como murta do brejo e alecrim silvestre".
"Plantas do pântano como murta do brejo e alecrim silvestre". Não é ou não é?
segunda-feira, outubro 11
:: As flores
Ontem comprei flores pra ela. As mais delicadas daquela floricultura da quitanda, que adoro. Não combinaram muito com o vaso, ela sabe. Aliás, precisamos sair para comprar vasos. Qualquer dia desses vamos fazer isso, comprar vasos. Quando cheguei, o jazz estava tão baixinho que mal conseguia ouvir. E ela estava ali na cozinha. Naquela cozinha aberta para a sala, com piso de ladrilho hidráulico, como se estivésemos nas fazendas de café do passado. Mesa posta, com taças lindas de vinho, mas tomei Coca. E ela nos serviu mais uma daquelas receitas do livro da Carla Pernambuco. Quando pegou emprestado aqui de casa, marcou receita por receita que queria fazer dali. E, a cada fim de semana, apronta uma coisa nova. Vai ao Santa Luzia fazer compras pela manhã, dos melhores ingredientes, depois organiza o mise en place com uma delicadeza que me espanta. Nos serviu neste domingo de chuva um bacalhau desfiado misturado com arroz branco e selvagem e uma pasta de linguado e maçã-verde do além _tudo enroladinho em folhas de uva.
Ontem comprei flores pra ela. As mais delicadas daquela floricultura da quitanda, que adoro. Não combinaram muito com o vaso, ela sabe. Aliás, precisamos sair para comprar vasos. Qualquer dia desses vamos fazer isso, comprar vasos. Quando cheguei, o jazz estava tão baixinho que mal conseguia ouvir. E ela estava ali na cozinha. Naquela cozinha aberta para a sala, com piso de ladrilho hidráulico, como se estivésemos nas fazendas de café do passado. Mesa posta, com taças lindas de vinho, mas tomei Coca. E ela nos serviu mais uma daquelas receitas do livro da Carla Pernambuco. Quando pegou emprestado aqui de casa, marcou receita por receita que queria fazer dali. E, a cada fim de semana, apronta uma coisa nova. Vai ao Santa Luzia fazer compras pela manhã, dos melhores ingredientes, depois organiza o mise en place com uma delicadeza que me espanta. Nos serviu neste domingo de chuva um bacalhau desfiado misturado com arroz branco e selvagem e uma pasta de linguado e maçã-verde do além _tudo enroladinho em folhas de uva.
sexta-feira, outubro 8
quinta-feira, outubro 7
:: Nova ortografia
Quando tivemos a reforma ortográfica, passamos por aulinhas, como antigamente na escola. A gente bufava mas, no final das contas, foram aulas divertidas e úteis. Depois disso, circulam e-mails para toda a Redação com dicas da nova ortografia _e outras mais, baseadas em erros notados no jornal do dia.
Ontem chegaram algumas orientações. A que eu mais gostei tá aqui. Tô pensando quando será que vou usar isso. Ansiosa.
"Palavras de origem onomatopeica agora são escritas com hífen:
blá-blá-blá, lenga-lenga, ti-ti-ti, nhe-nhe-nhem, tró-ló-ló etc."
Quando tivemos a reforma ortográfica, passamos por aulinhas, como antigamente na escola. A gente bufava mas, no final das contas, foram aulas divertidas e úteis. Depois disso, circulam e-mails para toda a Redação com dicas da nova ortografia _e outras mais, baseadas em erros notados no jornal do dia.
Ontem chegaram algumas orientações. A que eu mais gostei tá aqui. Tô pensando quando será que vou usar isso. Ansiosa.
"Palavras de origem onomatopeica agora são escritas com hífen:
blá-blá-blá, lenga-lenga, ti-ti-ti, nhe-nhe-nhem, tró-ló-ló etc."
quarta-feira, outubro 6
:: Lista para melhorar o dia
Hoje, ele sabe, estou mais pra lá do que pra cá. E então, depois de uma lágrima aqui e outra acolá, me mandou cinco e-mails "para melhorar o dia"
Tinha isso aqui dentro:
1. "We Can Work it Ou"t - Stevie Wonder
2. "Sem Compromisso" - Orquestra Imperial
3. "P.D.A." - John Legend
4. "Yes Indeed" - Ray Charles
5.
Hoje, ele sabe, estou mais pra lá do que pra cá. E então, depois de uma lágrima aqui e outra acolá, me mandou cinco e-mails "para melhorar o dia"
Tinha isso aqui dentro:
1. "We Can Work it Ou"t - Stevie Wonder
2. "Sem Compromisso" - Orquestra Imperial
3. "P.D.A." - John Legend
4. "Yes Indeed" - Ray Charles
5.
terça-feira, outubro 5
:: Virtual
Outro dia, ela mandou e-mail lá daquela cidade que mais amo, com o assunto "showzinho". Dentro, assim: "Assistindo Belle & Sebastian no parque e pensando na Luluca!!! Saudades"
Outro dia foi ele. Mandou e-mail de bom dia, com um trecho de Beto Guedes, num disco do Milton.
"No inverno te proteger, no verão sair pra pescar
no outono te conhecer, primavera poder gostar"
Outro dia, ela mandou e-mail lá daquela cidade que mais amo, com o assunto "showzinho". Dentro, assim: "Assistindo Belle & Sebastian no parque e pensando na Luluca!!! Saudades"
Outro dia foi ele. Mandou e-mail de bom dia, com um trecho de Beto Guedes, num disco do Milton.
"No inverno te proteger, no verão sair pra pescar
no outono te conhecer, primavera poder gostar"
segunda-feira, outubro 4
domingo, outubro 3
:: Uma noite num sábado
Fomos a um bar de jazz novo aqui das redondezas. Paredes de tijolo aparente, cortinas vermelhas de veludo, poltronas antigas e largas, de couro já meio surrado, sem perder o charme. Uma estante de livros nos fundos, com velharias, edições de páginas de lateral dourada e capa dura vinho ou marrom. Um quarteto de primeiríssima. Uma dose de Black Label. Bastante gelo. E a gente não quer quase mais nada. Quase.
Fomos a um bar de jazz novo aqui das redondezas. Paredes de tijolo aparente, cortinas vermelhas de veludo, poltronas antigas e largas, de couro já meio surrado, sem perder o charme. Uma estante de livros nos fundos, com velharias, edições de páginas de lateral dourada e capa dura vinho ou marrom. Um quarteto de primeiríssima. Uma dose de Black Label. Bastante gelo. E a gente não quer quase mais nada. Quase.
:: Amadorismo
Mamãe anda impressionada com o nosso amadorismo na política. Hoje, pela manhã, chegou a se irritar quando eu e minha irmã falávamos ao telefone, ainda indecisas em realação às eleições. Ela, que já teve nome de guerra, foi presa política e devora livros pela noite e jornais pela manhã, não se conforma diante da nossa falta de capacidade de nos familiarizarmos com o tema. "Mas mamãe a culpa é dos pais." Ela até riu. E tudo ficou bem melhor, depois.
Mamãe anda impressionada com o nosso amadorismo na política. Hoje, pela manhã, chegou a se irritar quando eu e minha irmã falávamos ao telefone, ainda indecisas em realação às eleições. Ela, que já teve nome de guerra, foi presa política e devora livros pela noite e jornais pela manhã, não se conforma diante da nossa falta de capacidade de nos familiarizarmos com o tema. "Mas mamãe a culpa é dos pais." Ela até riu. E tudo ficou bem melhor, depois.
:: Fúteis e inúteis
No carro, ela tira um treco da bolsa, coloca nas mãos e passa no cabelo. E eu dirigindo.
- Quer?
- Que que é isso?
- Silicone.
- Não, já passei tudo o que deveria depois do banho.
- É que o mocinho não tinha creme...
- Eles nunca têm creme e sempre usam Fruicts. Sempre. Dá-lhe silicone importado.
No carro, ela tira um treco da bolsa, coloca nas mãos e passa no cabelo. E eu dirigindo.
- Quer?
- Que que é isso?
- Silicone.
- Não, já passei tudo o que deveria depois do banho.
- É que o mocinho não tinha creme...
- Eles nunca têm creme e sempre usam Fruicts. Sempre. Dá-lhe silicone importado.
sábado, outubro 2
quinta-feira, setembro 30
quarta-feira, setembro 29
terça-feira, setembro 28
segunda-feira, setembro 27
domingo, setembro 26
:: Nos mínimos detalhes
Quando ela vai a Paris, lembra de mim porque sabe como sou atenta aos detalhes. Acho que é por isso. Depois, voltou da Itália com três presentes na bolsa: um tempero de trufas brancas, que estou economizando de maneira antipática, um panforte, bem firme, aromático e apimentado, e uma cafeteirinha Bialetti para apenas uma xicrinha de café. Aquela que a gente sempre, sempre quis comprar de tão linda, mas sempre resistiu.
Outro dia, me contou, lembrou de mim aqui mesmo no Brasil, em Porto Alegre. Contou que foi "a um teatro lindo"... antigo. E no andar de cima tem um salão de chá maravilhoso... com aqueles lustres de cristal, cortinas vermelhas de veludo, xícaras de porcelana... E cada torta, cada doce... madeleines delicadas para comer com o chá. A sua cara!".
Quando ela vai a Paris, lembra de mim porque sabe como sou atenta aos detalhes. Acho que é por isso. Depois, voltou da Itália com três presentes na bolsa: um tempero de trufas brancas, que estou economizando de maneira antipática, um panforte, bem firme, aromático e apimentado, e uma cafeteirinha Bialetti para apenas uma xicrinha de café. Aquela que a gente sempre, sempre quis comprar de tão linda, mas sempre resistiu.
Outro dia, me contou, lembrou de mim aqui mesmo no Brasil, em Porto Alegre. Contou que foi "a um teatro lindo"... antigo. E no andar de cima tem um salão de chá maravilhoso... com aqueles lustres de cristal, cortinas vermelhas de veludo, xícaras de porcelana... E cada torta, cada doce... madeleines delicadas para comer com o chá. A sua cara!".
sábado, setembro 25
quinta-feira, setembro 23
:: Pequenos prazeres
Hoje pela manhã, nós duas acordamos cedo, bem cedo, para fazer meninices. A mão, o pé, a depilação. E então colocamos, sem querer, o mesmo esmalte melancia e viemos de sapatinho e vestido. E ontem, olha que fofa, ela me trouxe uma tortinha divina de presente: pecan, mel e açúcar mascavo. Por isso que a vida fica melhor. Bem melhor.
Hoje pela manhã, nós duas acordamos cedo, bem cedo, para fazer meninices. A mão, o pé, a depilação. E então colocamos, sem querer, o mesmo esmalte melancia e viemos de sapatinho e vestido. E ontem, olha que fofa, ela me trouxe uma tortinha divina de presente: pecan, mel e açúcar mascavo. Por isso que a vida fica melhor. Bem melhor.
quarta-feira, setembro 22
:: Repeat
O disco da Lulina é bonitico demais. Ela pede pra gente não chamá-la de fofa. Mas... Fazer o quê? Já ouviu? Numa entrevista que ela deu pro Bruno Saito, na Ilustrada, falou assim: "Tem umas partes mais bonitinhas, outras mais escrotinhas. É uma mistura. Não venha me dizer que sou fofa. Tenho também a parte safada e brava, como qualquer pessoa normal". Mas o começo da matéria dele é o que mais gosto. Dessas que a gente queria ter escrito.
"A Lulilândia é um reino (des)encantado de solo bom para a criação de minhocas. Por ali caminha um príncipe pobretão que não tem cavalo branco. A população local comemora o Réveillon várias vezes ao ano, para esquecer as mágoas. E, enquanto olham para o céu, todos se embriagam com uma bebida chamada sangue de ET.
Lulilândia é também a mente frenética da publicitária Luciana Lins, 30 ("nascida em Recife, mas olindense de formação"), que, nas horas vagas, se transforma na cantora Lulina e cria músicas para os personagens desse peculiar universo. Tão peculiar que ela estreia por uma gravadora com "Cristalina", uma espécie de coletânea. Nos últimos oito anos, ela gravou nove discos caseiros."
O disco da Lulina é bonitico demais. Ela pede pra gente não chamá-la de fofa. Mas... Fazer o quê? Já ouviu? Numa entrevista que ela deu pro Bruno Saito, na Ilustrada, falou assim: "Tem umas partes mais bonitinhas, outras mais escrotinhas. É uma mistura. Não venha me dizer que sou fofa. Tenho também a parte safada e brava, como qualquer pessoa normal". Mas o começo da matéria dele é o que mais gosto. Dessas que a gente queria ter escrito.
"A Lulilândia é um reino (des)encantado de solo bom para a criação de minhocas. Por ali caminha um príncipe pobretão que não tem cavalo branco. A população local comemora o Réveillon várias vezes ao ano, para esquecer as mágoas. E, enquanto olham para o céu, todos se embriagam com uma bebida chamada sangue de ET.
Lulilândia é também a mente frenética da publicitária Luciana Lins, 30 ("nascida em Recife, mas olindense de formação"), que, nas horas vagas, se transforma na cantora Lulina e cria músicas para os personagens desse peculiar universo. Tão peculiar que ela estreia por uma gravadora com "Cristalina", uma espécie de coletânea. Nos últimos oito anos, ela gravou nove discos caseiros."
:: Pequenas ondas de felicidade
Quando éramos pequenas, tínhamos uma árvore da felicidade lá na casa da vila, bem ao lado da porta, quando saíamos da sala para o jardim de trepadeiras e ipês. Vez ou outra a gente ficava meio triste e mamãe nos levava até a tal da árvore, de mãos dadas, conversando bem manso. Quando chovia, por exemplo, era ali que a gente colocava um ovo para santa clara (clarear). Os ipês eram outra história. Eles cobriam o chão de flores amarelas, bem amarelas, como um tapete. Mas a gente tinha problema com a vizinha. Vê se pode: tínhamos problema com a vizinha porque enchíamos a casa dela de flores amarelas. O que uma pessoa que não gosta de flores poderia querer? Me lembro que, às vezes, à tarde, eu ligava para a mamãe no trabalho louquinha da vida porque a tal da vizinha estava podando nosso ipê. "Po-dan-do".
Quando éramos pequenas, tínhamos uma árvore da felicidade lá na casa da vila, bem ao lado da porta, quando saíamos da sala para o jardim de trepadeiras e ipês. Vez ou outra a gente ficava meio triste e mamãe nos levava até a tal da árvore, de mãos dadas, conversando bem manso. Quando chovia, por exemplo, era ali que a gente colocava um ovo para santa clara (clarear). Os ipês eram outra história. Eles cobriam o chão de flores amarelas, bem amarelas, como um tapete. Mas a gente tinha problema com a vizinha. Vê se pode: tínhamos problema com a vizinha porque enchíamos a casa dela de flores amarelas. O que uma pessoa que não gosta de flores poderia querer? Me lembro que, às vezes, à tarde, eu ligava para a mamãe no trabalho louquinha da vida porque a tal da vizinha estava podando nosso ipê. "Po-dan-do".
:: Sobre sonhos
Hoje ela acordou (e eu ainda não consigo entender como é que ela consegue dormir, com dois filhos pequenos) e veio me procurar logo pela manhã para contar do sonho. Sonhou que eu ficava muito, muito brava porque ela separou os figos grelhados da salada que meu pai havia preparado num almoço tardio, lá na casa da praia.
Hoje ela acordou (e eu ainda não consigo entender como é que ela consegue dormir, com dois filhos pequenos) e veio me procurar logo pela manhã para contar do sonho. Sonhou que eu ficava muito, muito brava porque ela separou os figos grelhados da salada que meu pai havia preparado num almoço tardio, lá na casa da praia.
terça-feira, setembro 21
:: Afinidades
Ele tem uma coisa comigo que pouca gente tem. Podemos passar meses, até anos, sem nos ver. Quando nos vemos é a mesma intimidade. Demora apenas minutos para qualquer conversa se desdobrar, como se fosse antigamente. Mais: o silêncio, quando aparece, nunca nos soa constrangedor.
Depois que nos vimos naquele fim de tarde, até o começo da madrugada, ao som que metade ele colocava, metade eu, foram pequenas lembranças misturadas com as dores do presente e as pequenas alegrias da vida. Sempre igual, ao som de Caetano, Dave Brubeck e coisas novas que eu mostrei para ele e ele mostrou pra mim. Com o arrepio de sempre diante das músicas novas.
Me contou que foi tocar no Timor Leste, que tem um gato e um cachorro numa casa na Lapa. Me contou do disco que foi gravar na Bahia e dos jingles que precisa produzir para fazer algum dinheiro. Me contou calmamente como foi que o amor aconteceu, nos pequenos detalhes, e que, no duro, isso e aquilo são coisas que não importam.
Ele lembrou das fitas K7 que trocamos na pré-adolescência e adolescência inteiras. E, quando começou a tocar Bowie, eu senti uma coisa no coração e então ele lembrou daquela fita que me gravou e mandou um amigo me levar na praia. "Mando eu enquanto fita", chamava. Como posso esquecer?
Comaçava com "Colégio Aplicação", dos Novos Baianos. Tinha também "Baioque", com a Bethânia, "Mano Caetano", com Bethânia e Jorge Ben. Tinha "Água de Meninos", com o Gil e "Derramando o Gai", com MPB 4. Mas aí, de repente, tinha David Bowie e eu fiquei horrorizada. David Bowie? Depois a gente cresce e as coisas ficam diferentes. Mas certas coisas, nunca mudam. Assim, como essa coisa que existe entre nós.
Ele tem uma coisa comigo que pouca gente tem. Podemos passar meses, até anos, sem nos ver. Quando nos vemos é a mesma intimidade. Demora apenas minutos para qualquer conversa se desdobrar, como se fosse antigamente. Mais: o silêncio, quando aparece, nunca nos soa constrangedor.
Depois que nos vimos naquele fim de tarde, até o começo da madrugada, ao som que metade ele colocava, metade eu, foram pequenas lembranças misturadas com as dores do presente e as pequenas alegrias da vida. Sempre igual, ao som de Caetano, Dave Brubeck e coisas novas que eu mostrei para ele e ele mostrou pra mim. Com o arrepio de sempre diante das músicas novas.
Me contou que foi tocar no Timor Leste, que tem um gato e um cachorro numa casa na Lapa. Me contou do disco que foi gravar na Bahia e dos jingles que precisa produzir para fazer algum dinheiro. Me contou calmamente como foi que o amor aconteceu, nos pequenos detalhes, e que, no duro, isso e aquilo são coisas que não importam.
Ele lembrou das fitas K7 que trocamos na pré-adolescência e adolescência inteiras. E, quando começou a tocar Bowie, eu senti uma coisa no coração e então ele lembrou daquela fita que me gravou e mandou um amigo me levar na praia. "Mando eu enquanto fita", chamava. Como posso esquecer?
Comaçava com "Colégio Aplicação", dos Novos Baianos. Tinha também "Baioque", com a Bethânia, "Mano Caetano", com Bethânia e Jorge Ben. Tinha "Água de Meninos", com o Gil e "Derramando o Gai", com MPB 4. Mas aí, de repente, tinha David Bowie e eu fiquei horrorizada. David Bowie? Depois a gente cresce e as coisas ficam diferentes. Mas certas coisas, nunca mudam. Assim, como essa coisa que existe entre nós.
segunda-feira, setembro 20
sexta-feira, setembro 17
:: Repeat
Acordei lendo e fazendo anotações. E já ouvi duas versões de "St. Louis Blues", uma com Django Reinhardt e Stéphane Grappelli e outra com Bessie Smith. Mas estou garimpando outras e outras versões. Me intriga essa coisa das leituras de uma mesma música. E por que será que certas músicas são gravadas por tantas, tantas pessoas?
Tempos atrás, por exemplo, fiz um levantamento de "Night in Tunisia". Só das que tenho no computador: Art Blakey, Cal Tjader, Count Basie, Chaka Khan, Dee Dee Bridgewater, Dexter Gordon, Ella Fitzgerald, jamey aebersold, Maynard Ferguson, Sonny Rollins, Wes Montgomery & George Benson & Kenny Burrell! Ufa!
Acordei lendo e fazendo anotações. E já ouvi duas versões de "St. Louis Blues", uma com Django Reinhardt e Stéphane Grappelli e outra com Bessie Smith. Mas estou garimpando outras e outras versões. Me intriga essa coisa das leituras de uma mesma música. E por que será que certas músicas são gravadas por tantas, tantas pessoas?
Tempos atrás, por exemplo, fiz um levantamento de "Night in Tunisia". Só das que tenho no computador: Art Blakey, Cal Tjader, Count Basie, Chaka Khan, Dee Dee Bridgewater, Dexter Gordon, Ella Fitzgerald, jamey aebersold, Maynard Ferguson, Sonny Rollins, Wes Montgomery & George Benson & Kenny Burrell! Ufa!
quinta-feira, setembro 16
:: Só pra ela
Hoje ela escreveu sobre John Lurie. E então lembrei de um poema que ele recita no disco que Medeski, Martin & Wood gravaram para crianças. É o que eu mais gosto. E escuto e volto e escuto e volto. Disse pra ela que, qualquer coisa, sempre que ela precisar, seja pelo que for, rodo o mundo atrás de um squalb pra ela. Eu também sempre quis ter um...
"A squalb will protect a little boy and a little girl throughout the day
and so that nothing bad will ever happen to you if you have a squalb
life will come at you in a beautiful way
things will be absolutely beautiful for you as you move through the day"
Hoje ela escreveu sobre John Lurie. E então lembrei de um poema que ele recita no disco que Medeski, Martin & Wood gravaram para crianças. É o que eu mais gosto. E escuto e volto e escuto e volto. Disse pra ela que, qualquer coisa, sempre que ela precisar, seja pelo que for, rodo o mundo atrás de um squalb pra ela. Eu também sempre quis ter um...
"A squalb will protect a little boy and a little girl throughout the day
and so that nothing bad will ever happen to you if you have a squalb
life will come at you in a beautiful way
things will be absolutely beautiful for you as you move through the day"
:: Pedaços
Teve um dia, tempos atrás, que ele andava com o coração despedaçado, com uma dor que a gente quase não suporta. Então escrevi uma carta. Uma carta com pensamentos. Tinha um recorte assim:
Aí fui ler Drummond, porque ainda não estou preparada para reler Clarice. E então, achei um trecho que quis copiar aqui pra você. Posso?
"Namorado é a mais difícil das conquistas.
Difícil porque namorado de verdade é muito raro.
Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia."
Depois ele respondeu. Por e-mail. Um e-mail lindo, desses que a gente guarda para reler aqui e acolá. Mas uma parte me matou. Assim: "Eu sei que tudo passa. Mas enquanto não passa é foda, né?"
Hoje ele está melhor. Eu também. Ufa.
Teve um dia, tempos atrás, que ele andava com o coração despedaçado, com uma dor que a gente quase não suporta. Então escrevi uma carta. Uma carta com pensamentos. Tinha um recorte assim:
Aí fui ler Drummond, porque ainda não estou preparada para reler Clarice. E então, achei um trecho que quis copiar aqui pra você. Posso?
"Namorado é a mais difícil das conquistas.
Difícil porque namorado de verdade é muito raro.
Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia."
Depois ele respondeu. Por e-mail. Um e-mail lindo, desses que a gente guarda para reler aqui e acolá. Mas uma parte me matou. Assim: "Eu sei que tudo passa. Mas enquanto não passa é foda, né?"
Hoje ele está melhor. Eu também. Ufa.
:: As leituras e o meu caderno de notas
Lendo enlouquecidamente. Grifando passagens incríveis da biografia de Louis Armstrong e aprendendo mais e mais sobre o jazz. Mais de uma, duas, três vezes Terry Teachout lembra que Armstrong não vivia sem os tais feijões-vermelhos com arroz. E, lá pelas tantas, tem a coisa do regime. Adorei. Olha:
"Como a maioria dos homens corpulentos, Armstrong estava sempre experimentado dietas diferentes em busca de um modo rápido de perder peso que não o impedisse de comer feijões-vermelhos e arroz. Lucille apresentou-o a Swiss Kriss, laxante de ervas. (...) Lembrava as ervas que sua mãe colhia nos trilhos de Nova Orleans e usava para cozinhar um laxante caseiro que dava aos filhos para combater os efeitos da comida gordurosa que comiam."
Lendo enlouquecidamente. Grifando passagens incríveis da biografia de Louis Armstrong e aprendendo mais e mais sobre o jazz. Mais de uma, duas, três vezes Terry Teachout lembra que Armstrong não vivia sem os tais feijões-vermelhos com arroz. E, lá pelas tantas, tem a coisa do regime. Adorei. Olha:
"Como a maioria dos homens corpulentos, Armstrong estava sempre experimentado dietas diferentes em busca de um modo rápido de perder peso que não o impedisse de comer feijões-vermelhos e arroz. Lucille apresentou-o a Swiss Kriss, laxante de ervas. (...) Lembrava as ervas que sua mãe colhia nos trilhos de Nova Orleans e usava para cozinhar um laxante caseiro que dava aos filhos para combater os efeitos da comida gordurosa que comiam."
quarta-feira, setembro 15
quinta-feira, setembro 9
terça-feira, setembro 7
segunda-feira, setembro 6
:: Comidinhas da alma
Ando lendo muito sobre a comida e as relações sociais. Registros históricos, principalmente. Outro dia dei uma geral em "A Fisiologia do Gosto", de Brillat-Savarin. Grifei, grifei, como sempre acontece. Mas anotei um trecho, em particular, no caderno de notas. Assim:
"A gastronomia, enfim, quando partilhada, exerce a mais nítida influência sobre a felicidade que se pode encontrar na união conjugal."
Depois li um bocado sobre a "invenção" do fogo e como ele é determinante nas relações. Como Fernández-Armesto diz, o fogo não tem importância somente por transformar os alimentos e sim por estabelecer a primeira forma de organização da sociedade. Era em torno das fogueiras, nos campos, que as pessoas se reuniam para comer. Eram momentos de comunhão.
Hoje foi mais ou menos assim. Era um dia normal de trabalho. Mas resolvi adiantar as coisas pela manhã e comprometer um tanto o meu fim de dia para abrir espaço para um almoço com as mulheres da família. Eu, minha irmã e minha mãe. Enquanto eu estava a ler e escrever, elas estavam na cozinha, fazendo pouco barulho e preparando algo muito perfumado.
No forno colocaram postas de robalo, com raspas de gengibre e tomilho, embaladas em papel-alumínio. A abóbora bem laranjinha foi cortada em cubinhos, regada com um bom azeite espanhol, farelos de queijo roquefort, tomilho e nozes. Também ao forno. Lili ainda fez algo que gosto muito: um cuscuz marroquino, mas sem frutas secas e afins. Só os grãos. Leves e delicados.
Depois, um café Nespresso curto, de uma edição limitada que gosto muito, com bolo de fubá de receita da Carla Pernambuco. Quem quis também provou um bolo fofo e molhadinho de maçã e nozes com chá. E então, ao trabalho. Sem choro, nem vela.
Ando lendo muito sobre a comida e as relações sociais. Registros históricos, principalmente. Outro dia dei uma geral em "A Fisiologia do Gosto", de Brillat-Savarin. Grifei, grifei, como sempre acontece. Mas anotei um trecho, em particular, no caderno de notas. Assim:
"A gastronomia, enfim, quando partilhada, exerce a mais nítida influência sobre a felicidade que se pode encontrar na união conjugal."
Depois li um bocado sobre a "invenção" do fogo e como ele é determinante nas relações. Como Fernández-Armesto diz, o fogo não tem importância somente por transformar os alimentos e sim por estabelecer a primeira forma de organização da sociedade. Era em torno das fogueiras, nos campos, que as pessoas se reuniam para comer. Eram momentos de comunhão.
Hoje foi mais ou menos assim. Era um dia normal de trabalho. Mas resolvi adiantar as coisas pela manhã e comprometer um tanto o meu fim de dia para abrir espaço para um almoço com as mulheres da família. Eu, minha irmã e minha mãe. Enquanto eu estava a ler e escrever, elas estavam na cozinha, fazendo pouco barulho e preparando algo muito perfumado.
No forno colocaram postas de robalo, com raspas de gengibre e tomilho, embaladas em papel-alumínio. A abóbora bem laranjinha foi cortada em cubinhos, regada com um bom azeite espanhol, farelos de queijo roquefort, tomilho e nozes. Também ao forno. Lili ainda fez algo que gosto muito: um cuscuz marroquino, mas sem frutas secas e afins. Só os grãos. Leves e delicados.
Depois, um café Nespresso curto, de uma edição limitada que gosto muito, com bolo de fubá de receita da Carla Pernambuco. Quem quis também provou um bolo fofo e molhadinho de maçã e nozes com chá. E então, ao trabalho. Sem choro, nem vela.
sábado, setembro 4
:: Caderno de notas
Hoje ele me mandou ler esse trecho aqui da Clarice Lispector:
"Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida."
Hoje ele me mandou ler esse trecho aqui da Clarice Lispector:
"Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença. Mas às vezes a saudade é tão profunda que a presença é pouco: quer-se absorver a outra pessoa toda. Essa vontade de um ser o outro para uma unificação inteira é um dos sentimentos mais urgentes que se tem na vida."
sexta-feira, setembro 3
terça-feira, agosto 31
:: Pequenas histórias
Outro dia, ele me contou que ia à feira muitas vezes com os pais, que cuidavam de uma barraca de doces. Passou um tempo, ele enjoou dos doces, parece. Ainda criança. Às vezes, demorava tanto para ir embora para casa, que sua mãe ia para debaixo da barraca com ele e com os irmãos. E lá ficavam. Ficavam deitadinhos em uma lona olhando os pés das pessoas que passavam de cá pra lá. Observavam os detalhes até serem capazes de identificar quem era quem. Uma senhora? Uma criança? Um pai de família? E o tempo passava e eles nem se davam conta. Lá pelas tantas, já era hora de irem para casa.
Outro dia, ele me contou que ia à feira muitas vezes com os pais, que cuidavam de uma barraca de doces. Passou um tempo, ele enjoou dos doces, parece. Ainda criança. Às vezes, demorava tanto para ir embora para casa, que sua mãe ia para debaixo da barraca com ele e com os irmãos. E lá ficavam. Ficavam deitadinhos em uma lona olhando os pés das pessoas que passavam de cá pra lá. Observavam os detalhes até serem capazes de identificar quem era quem. Uma senhora? Uma criança? Um pai de família? E o tempo passava e eles nem se davam conta. Lá pelas tantas, já era hora de irem para casa.
sábado, agosto 28
:: Caderno de notas
Ai, esse trecho de Tabacaria, de Álvaro de Campos. Olha:
"Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida."
Ai, esse trecho de Tabacaria, de Álvaro de Campos. Olha:
"Come chocolates, pequena;
Come chocolates!
Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.
Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria.
Come, pequena suja, come!
Pudesse eu comer chocolates com a mesma verdade com que comes!
Mas eu penso e, ao tirar o papel de prata, que é de folha de estanho,
Deito tudo para o chão, como tenho deitado a vida."
segunda-feira, agosto 23
sexta-feira, agosto 20
:: Gaveta
Outro dia me deram filetinhos de cana "in natura" para comer. E então mastiguei aquilo e lembrei de toda a infância. Da época em que eu acordada cedinho nas férias, na ponta dos pés, com o dia ainda coberto pela neblina do frio da manhã, e saía de bota para passear pelo sítio, antes do café. Dava uma olhada nas vacas, celava os cavalos e ia comer pão com frutas. Depois, passava o dia cavalgando. O dia. Se fizesse calor, a gente parava no meio do canavial, com alguém mais velho, que pudesse mexer com faca, e comíamos a cana ali mesmo. Vez ou outra, guardávamos um pedaço parrudo para comer em cima do cavalo, de volta pra casa, e ficávamos mascando aquilo até sobrar aquele tanto de fiapo.
Outro dia me deram filetinhos de cana "in natura" para comer. E então mastiguei aquilo e lembrei de toda a infância. Da época em que eu acordada cedinho nas férias, na ponta dos pés, com o dia ainda coberto pela neblina do frio da manhã, e saía de bota para passear pelo sítio, antes do café. Dava uma olhada nas vacas, celava os cavalos e ia comer pão com frutas. Depois, passava o dia cavalgando. O dia. Se fizesse calor, a gente parava no meio do canavial, com alguém mais velho, que pudesse mexer com faca, e comíamos a cana ali mesmo. Vez ou outra, guardávamos um pedaço parrudo para comer em cima do cavalo, de volta pra casa, e ficávamos mascando aquilo até sobrar aquele tanto de fiapo.
quinta-feira, agosto 19
quarta-feira, agosto 18
terça-feira, agosto 17
:: Cenas
Não deve ter sido das cenas mais bonitas, mas eu cantei no carro de novo. E alto. Essa música aqui, que eu queria ter escrito, mas foi o Gil. rá
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra vencer o tédio
Quando pintar
Essa é um santo remédio
Pro mau humor
Essa é pro chofer de táxi
Não cochilar
Essa é pro querido ouvinte
Do interior
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra sair de casa
Pra trabalhar
Essa é pro rapaz da loja
Transar melhor
Essa é pra depois do almoço
Moço do bar
Essa é pra moça dengosa
Fazer amor
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra tocar no rádio
Não deve ter sido das cenas mais bonitas, mas eu cantei no carro de novo. E alto. Essa música aqui, que eu queria ter escrito, mas foi o Gil. rá
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra vencer o tédio
Quando pintar
Essa é um santo remédio
Pro mau humor
Essa é pro chofer de táxi
Não cochilar
Essa é pro querido ouvinte
Do interior
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra sair de casa
Pra trabalhar
Essa é pro rapaz da loja
Transar melhor
Essa é pra depois do almoço
Moço do bar
Essa é pra moça dengosa
Fazer amor
Essa é pra tocar no rádio
Essa é pra tocar no rádio
segunda-feira, agosto 16
:: Os dias
Acordei cedo, sem perder a hora ou enrolar na cama. Fiz meus compromissos matinais sem sofrimento. Fui para o jornal ouvindo música e can-tan-do. Cheguei e trabalhei sem parar. Isso tudo hoje: uma segunda-feira de muito, muito frio. Deve haver alguma coisa errada. Ou, de repente, alguma coisa está entrando nos eixos.
Acordei cedo, sem perder a hora ou enrolar na cama. Fiz meus compromissos matinais sem sofrimento. Fui para o jornal ouvindo música e can-tan-do. Cheguei e trabalhei sem parar. Isso tudo hoje: uma segunda-feira de muito, muito frio. Deve haver alguma coisa errada. Ou, de repente, alguma coisa está entrando nos eixos.
sexta-feira, agosto 13
terça-feira, agosto 10
:: Caderno de notas
Coisas que eu grifo nos livros da Clarice...
"Quanto à música, depois de tocada, pra onde ela vai? A música só tem de concreto o instrumento. Bem atrás do pensamento tenho um fundo musical. Mas ainda mais atrás do pensamento há o coração batendo. Assim, o mais profundo pensamento é um coração batendo."
Coisas que eu grifo nos livros da Clarice...
"Quanto à música, depois de tocada, pra onde ela vai? A música só tem de concreto o instrumento. Bem atrás do pensamento tenho um fundo musical. Mas ainda mais atrás do pensamento há o coração batendo. Assim, o mais profundo pensamento é um coração batendo."
sábado, agosto 7
quinta-feira, agosto 5
:: Leituras
Li, de ontem para hoje, numa tacada só, "Chet Baker - Memórias Perdidas". Eu devia estar meio desorientada quando fui à livraria. Não tinha meu chá de cidreira e tive de tomar um de camomila. E então levei este livro pensando que era a biografia. Mas não. São relatos em primeira pessoa. Relatos mal escritos.
Me incomodou um pouco. Uma tradução porca que não tomou cuidado com coisas básicas do português e termos batidos que deram a sensação de estar lendo qualquer autor. O livro em si também não me disse grandes coisas. Ele se pica, vai preso, toca num canto, se pica. Aquele ciclo. Mas, no meio das palavras, encontrei detalhes que fizeram com que a minha leitura valesse a pena. Chet Baker gostava de comer caqui do pé.
No inverno poderoso, tinha de deixar o bocal dos instrumentos de sopro na boca, senão congelava e, na hora de tocar, congelava os lábios. Numa primavera, que passou nos arredores de Berlim, costumava velejar durante horas num lago. Sozinho. Sozinho com um radinho portátil, onde ouviu pela primeira vez Dizzy Gillespie. Ai. Lá pelas tantas, até trocou um anel de "ouro com uma água-marinha de dois quilates e duas safiras" por um pequeno bote a motor, usado para levá-lo da margem até o barco a vela.
Chet Baker cresceu numa fazenda. Nos verões, caminhava na estrada de terra para colher framboesas silvestres. Também comia melões. Os colocava sobre a cabeça para que caíssem no chão e, na queda, abriam sobre a terra e ele podia escolher os pedaços mais adocicados. Sua mãe trabalhava numa fábrica de sorvetes e levava sorvete para casa todas as noites.
Também gostava de mergulhar em busca de conchas de madrepérolas.
Foi com o pianista de Peggy Lee, Jimmy Rowles, que aprendeu "sobre como simplificar as coisas e não complicar demais a maneira de tocar meu instrumento". Tocou com Dave Brubeck, Paul Desmond, Stan Getz, Charlie Parker, Gerry Mulligan.
Quando foi preso na Itália, sua mulher mandava livros e mais livros. E ele lia. Lia. Tocava um pouco de trompete. Compunha. Conta de um dia em que tocou num clube em Nápoles um sujeito roubou seu trompete. "Imaginei que fosse porque costumavam me chamar de 'trombo doro', e o cara que levou o trompete deve ter achado que ele era mesmo de ouro bruto."
Comia espaguete com garçons, músicos e barmen depois dos shows. E foi na cozinha que começou a tocar flugelhorn.
Li, de ontem para hoje, numa tacada só, "Chet Baker - Memórias Perdidas". Eu devia estar meio desorientada quando fui à livraria. Não tinha meu chá de cidreira e tive de tomar um de camomila. E então levei este livro pensando que era a biografia. Mas não. São relatos em primeira pessoa. Relatos mal escritos.
Me incomodou um pouco. Uma tradução porca que não tomou cuidado com coisas básicas do português e termos batidos que deram a sensação de estar lendo qualquer autor. O livro em si também não me disse grandes coisas. Ele se pica, vai preso, toca num canto, se pica. Aquele ciclo. Mas, no meio das palavras, encontrei detalhes que fizeram com que a minha leitura valesse a pena. Chet Baker gostava de comer caqui do pé.
No inverno poderoso, tinha de deixar o bocal dos instrumentos de sopro na boca, senão congelava e, na hora de tocar, congelava os lábios. Numa primavera, que passou nos arredores de Berlim, costumava velejar durante horas num lago. Sozinho. Sozinho com um radinho portátil, onde ouviu pela primeira vez Dizzy Gillespie. Ai. Lá pelas tantas, até trocou um anel de "ouro com uma água-marinha de dois quilates e duas safiras" por um pequeno bote a motor, usado para levá-lo da margem até o barco a vela.
Chet Baker cresceu numa fazenda. Nos verões, caminhava na estrada de terra para colher framboesas silvestres. Também comia melões. Os colocava sobre a cabeça para que caíssem no chão e, na queda, abriam sobre a terra e ele podia escolher os pedaços mais adocicados. Sua mãe trabalhava numa fábrica de sorvetes e levava sorvete para casa todas as noites.
Também gostava de mergulhar em busca de conchas de madrepérolas.
Foi com o pianista de Peggy Lee, Jimmy Rowles, que aprendeu "sobre como simplificar as coisas e não complicar demais a maneira de tocar meu instrumento". Tocou com Dave Brubeck, Paul Desmond, Stan Getz, Charlie Parker, Gerry Mulligan.
Quando foi preso na Itália, sua mulher mandava livros e mais livros. E ele lia. Lia. Tocava um pouco de trompete. Compunha. Conta de um dia em que tocou num clube em Nápoles um sujeito roubou seu trompete. "Imaginei que fosse porque costumavam me chamar de 'trombo doro', e o cara que levou o trompete deve ter achado que ele era mesmo de ouro bruto."
Comia espaguete com garçons, músicos e barmen depois dos shows. E foi na cozinha que começou a tocar flugelhorn.
terça-feira, agosto 3
segunda-feira, agosto 2
:: Cidade dos sonhos
- Ei, vamos na livraria agora? Tomar um chá e ver uns livros?
- Não, né...
- Vamos, vamos!
- Agora?
- É. Você aperta um botão aí e aparece aqui. E aí vamos na Livraria da Vila, que é minha predileta. Tomamos um chá de cidreira com bolo de limão. Bolo de limão com raspas de casca de limão em cima. E então cada um faz uma pilhinha de livros. Cada um faz a sua e leva pro café, lá atrás, onde a gente deve sentir um pouco de frio.
Mas tudo bem. Ficamos quietinhos vendo nossas pilhinhas de livros e resolvendo o que levar. Hein, hein?
- Ei, vamos na livraria agora? Tomar um chá e ver uns livros?
- Não, né...
- Vamos, vamos!
- Agora?
- É. Você aperta um botão aí e aparece aqui. E aí vamos na Livraria da Vila, que é minha predileta. Tomamos um chá de cidreira com bolo de limão. Bolo de limão com raspas de casca de limão em cima. E então cada um faz uma pilhinha de livros. Cada um faz a sua e leva pro café, lá atrás, onde a gente deve sentir um pouco de frio.
Mas tudo bem. Ficamos quietinhos vendo nossas pilhinhas de livros e resolvendo o que levar. Hein, hein?
segunda-feira, julho 26
:: Mulheres do jazz
Tem um monte de coisa para escrever. Sempre é assim porque reparo com muito cuidado nos detalhes. De qualquer coisa. Tem um monte de coisa para registrar, como termos feito maquiagem, delicadérrima, com o gay que produz as drag queens da Parada Gay, que eu cheguei com a noiva no meu automóvel e senti um nervoso que nunca tinha experimentado _é pior que dirigir com grávida ou com criança pequena_, que o pôr-do-sol, lá do topo da cidade, estava deslumbrante. Mas o que importa mesmo é que eles entraram com Etta James. Etta James. E, claro, vão ser muito felizes.
Tem um monte de coisa para escrever. Sempre é assim porque reparo com muito cuidado nos detalhes. De qualquer coisa. Tem um monte de coisa para registrar, como termos feito maquiagem, delicadérrima, com o gay que produz as drag queens da Parada Gay, que eu cheguei com a noiva no meu automóvel e senti um nervoso que nunca tinha experimentado _é pior que dirigir com grávida ou com criança pequena_, que o pôr-do-sol, lá do topo da cidade, estava deslumbrante. Mas o que importa mesmo é que eles entraram com Etta James. Etta James. E, claro, vão ser muito felizes.
:: Registros de viagem
Papai passou uns dias fora. De lá daquela terra onde fiz minha primeira viagem sozinha, de mochilão, de norte a sul. Uma terra que chamam de Chile. De lá, mandava recadinhos como pequenos filmes de pequenos momentos. Os pequenos momentos que a gente não esquece. Tenho precisado disso. Deixar de lado os grandes momentos e abrir espaço para pequenos acontecimentos.
Bem, contou do dia em que o carro amanheceu coberto de gelo, descreveu o nascer do sol do outro lado do lago. A vista para o Osorno. Contou do dia em que subiu no vulcão até encontrar neve. Na volta, disse, parou num canto para tomar pisco e camarones.
Teve um dia que escreveu mais à noite. Havia ido a um concerto de cello, de uma solista inglesa, num teatro que foi construído dentro do lago llanquille. Falou também do pôr-do-sol, do céu rosado, do vulcão ao fundo. Do dia em que foi jantar no Astrid & Gaston. Você conhece, filha? É incrível. Conheço, pai. É mesmo incrível.
Passou um tempo, me pediu conselho. Veja só, o que eu sugeria além de ceroulas, cachecol, meias de lã, gorro, sapatos forrados, pisco e vinho. Sugeri que voltasse. Porque, ele sabe, não gosto de sentir saudade. Até hoje não aprendi. Passou mais uns dias e ele voltou.
Preparou a mesa do café da manhã com louças campestres e taças para o suco de laranja natural. Era manhã e a casa estava toda ensolarada. E então ele foi até o fogão fazer “ovos revueltos”, enquanto os pães esquentavam. Como quando éramos pequenas. Até hoje é assim. Os melhores ovos mexidos. Vai ser sempre assim.
Papai passou uns dias fora. De lá daquela terra onde fiz minha primeira viagem sozinha, de mochilão, de norte a sul. Uma terra que chamam de Chile. De lá, mandava recadinhos como pequenos filmes de pequenos momentos. Os pequenos momentos que a gente não esquece. Tenho precisado disso. Deixar de lado os grandes momentos e abrir espaço para pequenos acontecimentos.
Bem, contou do dia em que o carro amanheceu coberto de gelo, descreveu o nascer do sol do outro lado do lago. A vista para o Osorno. Contou do dia em que subiu no vulcão até encontrar neve. Na volta, disse, parou num canto para tomar pisco e camarones.
Teve um dia que escreveu mais à noite. Havia ido a um concerto de cello, de uma solista inglesa, num teatro que foi construído dentro do lago llanquille. Falou também do pôr-do-sol, do céu rosado, do vulcão ao fundo. Do dia em que foi jantar no Astrid & Gaston. Você conhece, filha? É incrível. Conheço, pai. É mesmo incrível.
Passou um tempo, me pediu conselho. Veja só, o que eu sugeria além de ceroulas, cachecol, meias de lã, gorro, sapatos forrados, pisco e vinho. Sugeri que voltasse. Porque, ele sabe, não gosto de sentir saudade. Até hoje não aprendi. Passou mais uns dias e ele voltou.
Preparou a mesa do café da manhã com louças campestres e taças para o suco de laranja natural. Era manhã e a casa estava toda ensolarada. E então ele foi até o fogão fazer “ovos revueltos”, enquanto os pães esquentavam. Como quando éramos pequenas. Até hoje é assim. Os melhores ovos mexidos. Vai ser sempre assim.
quinta-feira, julho 22
:: Caderno de notas
Ela escreveu pela manhã para contar que sonhou comigo. Você me dava de presente uma caixa de brigadeiros da Maria Brigadeiro, disse.
Já minha aborinha, minha inspiração, perguntou se ela pode plantar uma minirrucula. Eu posso até botar minhoca, disse. Mas a minhoca não come rúcula? Se ela comer minha rúcula eu vou ficar deveras puta.
Ela escreveu pela manhã para contar que sonhou comigo. Você me dava de presente uma caixa de brigadeiros da Maria Brigadeiro, disse.
Já minha aborinha, minha inspiração, perguntou se ela pode plantar uma minirrucula. Eu posso até botar minhoca, disse. Mas a minhoca não come rúcula? Se ela comer minha rúcula eu vou ficar deveras puta.
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